20
de setembro de 2005
Antes
de qualquer anotação, convém
dizer que 2 filhos de Francisco, a história
de Zezé de Camargo e Luciano (2005) é um
filme que surpreende. Não se trata, como se
poderia esperar ao encarar o estrelismo atual dos
protagonistas (dois cantores sertanejos irmãos
muito populares, disseminados pelo rádio e
pela televisão do país), de um oba-oba
sobre duas personagens da mídia em que o enxerto
de números musicais de esperada aceitação
do público carregasse as falhas do ritmo narrativo.
Ao contrário: o diretor estreante Breno Silveira,
valendo-se de um elaborado roteiro em que entre os
colaboradores está o experimentado cineasta
Domingos de Oliveira, demonstra habilidade para contar
bem sua história; Silveira utiliza os episódios
da vida de Zezé de Camargo e Luciano como
mote para espiar os cantões esquecidos dum
Brasil de misérias; é árdua
a caminhada de ascensão social dos dois caipiras
goianos que são na verdade um projeto da obsessão
de seu pai: ele queria fazer de seus dois primeiros
filhos duma dupla de cantores sertanejos de sucesso,
a morte de um dos meninos numa destas andanças
em busca de show arrefece o entusiasmo momentaneamente
mas não o mata; é delirante a seqüência
em que o pai envia a fita da primeira canção
de seus filhos (a dupla se formou com outro irmão,
bem mais novo, tempos depois da morte do outro) a
uma rádio e depois gasta todo seu salário
em fichas telefônicas convidando seus colegas
e amigos a ligarem para a rádio e pedirem
a música dos garotos.
Não é que o filme apresente propriamente
algo inovador para o cinema brasileiro. Mas sua capacidade
de emocionar está sempre presente. É um
filme das nossas origens. Por mais que nos sofistiquemos,
os sons caipiras que todos ouvimos na infância
marcam os primeiros ecos de nossa existência.
De certa maneira, o filme alarga um pouco seus horizontes
de linguagem ao introduzir, no fim do filme, os próprios
cantores num show e os pais dos artistas de inopino,
pais que foram peças essenciais da narrativa.
Sai-se da ficção para aquilo que na
década de 80 se chegou a chamar melodocudrama,
fusão inviável do melodrama com o documentário.
Pode-se
evocar aqui o já clássico A
estrada da vida (1980), de Nelson Pereira dos Santos,
sobre a dupla caipira Milionário e José Rico.
Silveira trilha o mesmo caminho: trata suas personagens
como figuras comuns e não como estrelas, a
máscara do estrelato que hoje no sucesso eles
são obrigados a assumir. O realismo cinematográfico
brasileiro agradece.
Menção especial para o eterno ator
do cinema brasileiro, José Dumont. Sem desmerecer
a homogeneidade de todo o elenco: eu particularmente
sou apaixonado pela persona interpretativa de Dira
Paes, que tem cruzado os filmes brasileiros de norte
a sul, de Amarelo manga (2002), do pernambucano Cláudio
Assis, a Noite de São João (2003),
do gaúcho Sérgio Silva.
Por
Eron Fagundes