A LIBIDO EM CENA
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12 de julho de 2005

Pretenderia o cineasta inglês Michael Winterbottom reeditar, em 9 canções (9 songs; 2004), a atmosfera escandalosa e tragicamente escandalosa que O império dos sentidos (1976), do japonês Nagisa Oshima, e Diabo no corpo (1986), do italiano Marco Bellochio, lograram impor ao público em suas épocas? Já em seu filme anterior, Código 46 (2003), exibido em Porto Alegre no início do ano, uma tensa seqüência de sexo surgia, e a função da câmara como o olhar e o corpo do espectador era provocativamente libidinosa. Em 9 canções a libido é a própria narrativa.

Inicialmente as cenas de sexo são ocultadas por imagens em penumbras. À medida que o assistente é mais fortemente introduzido na intimidade do jovem casal em cena, a câmara vai perdendo o pudor e mostra mais. Uma felação que refaz a cena clássica do filme de Bllochio em que uma enlouquecida Maruschka Detmers se atraca no pênis de seu parceiro até a ejaculação. Um entra-e-sai do órgão sexual de Kieran O’Brien na vagina de Margo Stilley que se está debruçando sobre o corpo do homem.

Winterbottom, seguindo a linha de seus trabalhos anteriores, é semidocumental. As características documentárias de seu cinema tornam sua contemplação do sexo um tanto diferente do que faziam os cineastas eróticos nas décadas de 70 e 80. Costurada por canções transgressoras tocadas nos concertos a que os protagonistas vão assistir em Londres, a trama acompanha de maneira muitas vezes arrastada e sem ímpeto o relacionamento de Lisa e Matt; apesar de curto (70 minutos), o filme tem lá seus momentos de enfado, não repetindo a inventividade de Código 46. Tratar de sexo o tempo inteiro é uma coisa difícil, mas Winterbottom não falha completamente, a centelha inconformista de seu cinema dá algum sopro a este processo de libertinagem, formal e temática.

E, como feixe, imagens da gelada Antártica, que é de onde Matt narra para o observador sua aventura erótica com Lisa. O contraste entre o gelo da paisagem do continente inóspito e o frenesi de sexo e música do ambiente londrino confere um certo brilho a 9 canções.

Por Eron Fagundes