A OBESSÃO AMOROSA SEGUNDO OS FRANCESES
eron@dvdmagazine.com.br

20 de outubro de 2003

tempo de cinema francês em Porto Alegre. O cinema Guion traz um ciclo de filmes franceses contemporâneos. A Casa de Cultura Mário Quintana recoloca em cartaz alguns clássicos realizados na França. Está sendo exibido Quem sabe? (2001), um Jacques Rivette menor, mas um Rivette, ainda que menor, é sempre melhor do que quase tudo o que passa por aí.

O presente comentário vai dedicar-se a analisar Bem me quer, mal me quer (A la folie... pas du tout; 2002), de Laetitia Colombani. Trata-se dum drama exacerbadamente romântico: um melodrama com os cabelos em desalinho. Inevitavelmente o espectador acaba pensando em François Truffaut, o mestre das crônicas do amor louco, que em A história de Adèle H. (1975) falava duma paixão desmesurada da filha do escritor Victor Hugo; mas vai uma distância notável entre a apaixonada criatividade e força narrativas de Truffaut e a desbotada objetividade (meio à Hollywood) de Laetitia.

O problema já começa com a atriz que vive a protagonista, Audrey Tatou: ela repete seu estereotipado desempenho visto em O fabuloso destino de Amélie Poilain (2001), de Jean-Pierra Jeunet. A superficialidade da personagem se evidencia; sua loucura truffautiana, querendo viver um amor que só existe em sua imaginação, é tempo perdido. Falta aprofundar a sensibilidade: falta o senso cinematográfico de Truffaut. A realizadora busca dar uma roupagem um pouco diferente ao propor duas versões para os episódios: o ponto de vista da apaixonada (irreal) e o ponto de vista da vítima da paixão; entre a demência da jovem pintora fascinada pelo objeto de seu amor e os percalços que este amor ignorado traz à vida ordeira de um cardiologista o filme se perde em suas trivialidades.

É claro que é sempre bom que chegue ao espectador brasileiro todos os filmes europeus possíveis. Mas Bem me quer, mal me quer só provoca saudades do mestre Truffaut. Isto já não havia ocorrido quando O fabuloso destino de Amélie Poulain andou por aqui?

Por Eron Fagundes