UM CERTO NATURALISMO BRASILEIRO
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03 de agosto de 2005

O espectador tarda em acostumar-se com os primeiros movimentos do filme brasileiro Bendito fruto (2005), de Sérgio Goldenberg. O naturalismo de filmar é insistente e provoca um distanciamento com o observador; os gestos das personagens são os gestos que fazemos todos os dias e que a indústria nos convence de que não são gestos dignos duma criatura de cinema. As relações amorosas ambíguas de um cabeleireiro madurão com sua apaixonada empregada negra são descritas com doçura realista, uma recapitulação de uma narrativa que os nossos cineastas habitualmente desistiram de fazer; as questões em casa, o universo do salão em que o protagonista trabalha, o filho cantor que está no estrangeiro e nunca soube antes que seu pai era o cabeleireiro, tudo Gondelberg costura com uma paciência que, depois de um início hesitante, conquista o assistente.

É claro que Bendito fruto tem lá suas debilidades. O ser interpretado por Eduardo Moscovis (homossexual que tem um caso com o filho da preta) é um ator de telenovelas. O lado realista de observar um povo marcado pela avalancha de novelas televisivas é um dado do naturalismo do filme e está bem articulado. O problema é que lá pelas tantas as facilidades das soluções dramáticas de Goldenberg não deixam de render-se ao estilo sem sutilezas da televisão. Aí o filme empaca e é superficial.

Mas nada disto desfaz sua curiosidade no seio do atual cinema brasileiro. Otávio Augusto, na pele do cabeleireiro, é notavelmente sensível e demonstra que sua passagem pelo palco da televisão não transformou suas interpretações em veículo de estrelismo. Zezeh Barbosa contracena bem com ele. E Vera Holtz tem um desempenho divertido. Lúcia Alves é uma aparição banfazeja. Fotografado com delicadeza por Antonio Luis Mendes, um veterano de nossa iluminação cinematográfica, e musicado com canções nostálgicas, Bendito fruto merece ser visto.

Por Eron Fagundes