RECRIANDO A TERRÍVEL REALIDADE
 

 

27 de dezembro de 2006

Os aspectos objetivamente políticos de uma certa vertente do cinema do inglês Michael Winterbottom remetem àquelas polêmicas pescadas pelo greco-francês Constantin Costa-Gavras nos anos 60 e 70 do século passado. Em O caminho para Guantánamo ( (The road to Guantánamo; 2006) ele retoma uma certa virulência documental de filmar que estava na base de um de seus melhores filmes, Bem-vindo a Sarajevo (1997); curiosamente o mais inquietante trabalho rodado pelo realizador britânico foge inteiramente a esta característica verista, Código 46 (2006), mas mantém a força crítica de sua visão de mundo. O caminho para Guantánamo é um filme correto em devastar a imbecilidade da violência humana em todas as latitudes e na maneira como Winterbottom funde o documentário com a ficção (as personagens de Ruhel Ahmed, Asif Iqbal, Shafiq Rasul são interpretadas por eles mesmos, Ruhel, Asif e Shafiq, que recriam o que viveram um pouco à maneira do neo-realismo italiano, remontado num estilo mais trêfego pelo diretor inglês); mas algo faltou, um sopro qualquer duma criatividade mais pessoal, para que o filme funcionasse para além dum objeto de denúncia política.

Ouvi dizer que Winterbottom poria no chinelo o documentarista americano Michael Moore na visão grotesca do governo Bush. A verdade é que aqui Winterbottom se assemelha muito a Moore; e quem apareceu primeiro neste quesito foi Moore. Se há puerilidade em Moore, ela igualmente se transmite a Winterbottom.

Não que O caminho para Guantánamo não seja um filme importante. É que ele é mais importante do que bom. Provoca muito nossa simpatia mas bem pouco nosso prazer.

Por Eron Fagundes

| topo da página |