O casamento esteve em foco na objetiva de alguns filmes que bateram nas telas dos cinemas da cidade este ano. O tema do casamento e da família já teve, ao longo da história do cinema, algumas concepções revolucionárias nas mãos de alguns cineastas verdadeiramente inspirados, como o sueco Ingmar Bergman, o italiano Luchino Visconti ou o norte-americano Robert Altman, para ficar entre os fundamentais. Não é o caso das fitas aqui referidas, todas muito comuns e inevitavelmente conformistas em seu comercialismo atroz.
Creio que o mais curioso deste grupo de realizações seja Casamento arranjado (2001), dirigido pelo israelense Dover Hoshashvili. Pelo menos aqui o realizador é suficientemente irônico para dissecar os arranjos da moral, desnudando a hipocrisia da conduta social, à maneira do que faziam os grandes autores literários do século XIX (o francês Gustave Flaubert e o português Eça Queiroz, cujo O crime do padre Amaro vem aí numa produção mexicana). Mas falta ainda o grande salto para a profundidade cinematográfica.
Em Aniversário de casamento (2001), obrado a quatro mãos pelo casal de diretores Alan Cunning e Jennifer Jason Leigh (que interpretam quase a si mesmos na tela), a possível veracidade se perde, a despeito da leveza formal conferida pelas câmaras digitais.
Um casamento à indiana (2001), de Mira Nair, se atrapalha em sua exótica lentidão, superficializando tudo o que toca. As facilidades cômicas de Casamento grego (2002), de Joel Zwick, só servem mesmo para o riso fútil. Futilidade está igualmente em O filho da noiva (2001), de Juan José Campanella, que andou conquistando certa fatia do público por seu coeficiente de sentimentalidade elaborada (algo diverso da sentimentalidade hollywoodiana de Escrito nas estrelas, de Peter Chelson, outra obra que enfim e ao cabo vai desaguar num casamento).
Os casamentos cinematográficos de 2002 não são estimulantes. Se o casamento em cinema é esta mornidão, melhor seria ficar solteiro. Do lado de fora das salas de projeção.
Terminando mais um ano, quero desejar aos que prestigiam esta página um grande final de temporada, augúrio de um Ano Novo de realizações. Aproveito igualmente para oferecer minha lista dos dez melhores filmes de 2002: Le bassin de John Wayne, de João César Monteiro; Elogio ao amor, de Jean-Luc Godard; O fio da inocência, de Atom Egoyam; O príncipe, de Ugo Giorgetti; O homem que não estava lá, de Joel Coen; Cidade dos sonhos, de David Lynch; Lavoura arcaiica, de Luiz Fernando Carvalho; Vou para casa, de Manoel de Oliveira; Passion, de Jean-Luc Godard; Lucia e o sexo, de Julio Meden.
Por
Eron Fagundes