INTIMIDADDES FRANCESAS
eron@dvdmagazine.com.br

11 de abril de 2005

As características básicas do cinema francês, especialmente naquilo que ele se opõe à majoritária indústria americana de filmes, podem ser topadas em Confidências muito íntimas (Confidences trop intimes; 2004), película rodada por Patrice Leconte, cineasta de carreira bastante irregular pelo que se pode acompanhar por aqui. O tom de conversação banal, uma busca da espontaneidade do ator atingida com um notável rigor de encenação, certas insistências íntimas e o desfocado formal de algumas imagens são dados caseiros que o espectador que vê filmes há muitos anos já identificou em obras de realizadores mais capazes do que Leconte.

O problema fundamental deste novo trabalho de Leconte (que foi surpreendente na captação de um ambiente em O marido da cabeleireira, 1990) é o esvaziamento de seu tom narrativo, que se torna murcho com o andar da projeção; aquilo que deveria ser um rol de achados do cotidiano se converte numa frouxidão estilística que provoca inevitavelmente sono no observador mais afeito às citadas características francesas de filmar. Leconte vai dirigindo sua produção com razoável competência técnica; e o dueto interpretativo entre Fabrice Luchini (que já trabalhou com Eric Rohmer e aqui se parece muito com um intérprete rohmeriano) e Sandrine Bonnaire (cuja evocação mais antiga é sua figura de adolescente no memorável Aos nossos amores, 1983, de Maurice Pialat) funciona perfeitamente à margem dos escassos méritos da fita. Onde está, pois, o incômodo que atrapalha o desfrute de tal peça cinematográfica? Os dados lançados em cena se desajustam porque a direção de Leconte confunde frouxidão com sutileza: sutil sim, mas sonífero; a delicadeza francesa se espatifa contra a tela.

Entre as muitas homenagens desta obra de Leconte, que mais se parece com um sub-Rohmer, há uma bastante explícita a Janela indiscreta (1954), de Alfred Hitchcock, ao mostrar a personagem de Luchini espiando de sua janela os diversos planos de outras janelas que surgem diante da sua como uma panorâmica. Mas as citações, aqui, são sempre mais pretensiosas do que encaixadas nos significados do roteiro.

Por Eron Fagundes