CINEMA LITERÁRIO PARA BOBOS
 

 

10 de dezembro de 2007

Em Crimes de autor (Roman de gare; 2007) o veterano realizador francês Claude Lelouch roda um filme em que a pretendida sofisticação literária da encenação vai ter a um vazio tão grande que só pode preencher os cérebros dos bobos. Toda a casca de Crimes de autor obedece a um pastiche da sutileza de filmar em que os franceses se esmeram desde Jean Renoir; Lelouch não aprendeu quase nada com os grandes cineastas de seu país e na velhice segue fazendo um cinema formalmente estéril e melodramaticamente superficial.

Como seu patrício Alain Resnais, Lelouch gosta de carrosséis narrativos, como se sabe desde o confuso e caleidoscópio Retratos da vida (1981); mas onde Resnais aclara as coisas, pois tem o senso de cinema para montar seus cruzamentos, Lelouch se perde em superficialidades. Crimes de autor é o mais novo retrato fílmico das confusões de Lelouch.
Desta vez ele arma um jogo policial cujo mistério pretende conferir alguma tensão à narrativa. Debalde: tudo é muito exangue em cena. Uma escritora de livros policiais está em busca duma nova história; enquanto isto, uma de suas leitoras, uma jovem cabeleireira, é abandonada pelo noivo e acaba cruzando-se com um homem estranho, que a certa altura se apresenta como o ghost writer da famosa romancista. Interligando vários segmentos (há até o diálogo da autora com um crítico, talvez o ponto mais curioso deste precário filme), Lelouch se esforça por estabelecer mais uma destas co-relações entre a vida e a ficção tomando por base aquilo que de ficcional as cabeças das pessoas transportam para a vida. Ocorre que estas complicadas questões são esboços rasos nas mãos de Lelouch.

É mais um daqueles filmes em que o elenco é bom mas é mal usado numa narrativa. Fanny Ardant, a eterna viúva de François Truffaut, tem altos e baixos ao longo do filme. Audrey Dana como a leitora-cabeleireira dá conta dramática de seu papel. E Dominique Pisom, com seu jeito do ator brasileiro Matheus Nachtergaele, é o desempenho mais criativo de todos.

Ainda não foi desta vez que Lelouch chegou lá. No rol das equivalências cinematográficas, pode-se dizer que Lelouch gostaria de ser Resnais quando crescesse, assim como o norte-americano Steven Spielberg emula às vezes um filhote de outro norte-americano, Stanley Kubrick. Lelouch-Resnais: a literatura no cinema. Spielberg-Kubrick: a técnica no cinema.

Por Eron Fagundes

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