15 de setembro de 2006
O cineasta indo-americano M. Night Shyamalan sempre força a passagem da ingenuidade de suas tramas para uma assunção infantil de sua visão de mundo. Dizem seus defensores (como outrora diziam os amantes os amantes do cinema que o norte-americano Steven Spielberg fazia nos anos 70 e 80) que devemos abdicar de uma certa sofisticação adulta para mergulhar na característica primária de seu universo. Talvez. Mas A dama na água (Lady in the water; 2006) é uma narrativa tão boba em sua simbologia de fábula contemporânea que se teme pelo futuro das estruturas de Shyamalan; a coisa meio que desmorona e expõe sua osteoporose cinematográfica com inegável clarividência ao longo de quase duas horas de ritmo lento, marcadamente contemplativo. Se Shyamalan vai afastar-se do espectador crítico por suas insistências ingênuas e se o público da indústria que ele quer paparicar não tem saco para sua montagem semi-oriental, que lhe sobra?
Shyamalan é esperto. Antevendo os problemas de seu filme, ele põe em cena um casmurro e estereotipado crítico de cinema, estabelecendo assim uma blindagem contra a recepção cinematográfica: o filme basta-se a si mesmo. Irônico e perverso, ele destina a esta personagem odiada por seu criador um final trágico que se engolfa nos símbolos do conto que se está narrando. As criaturas de Paul Giamatti (o zelador de prédio Cleveland) e de Bryce Dallas Howard (a ninfa que assoma da piscina do prédio em busca de um misterioso escritor que estaria escrevendo algo importante) são os elementos que se esforçam por dar algum sentido aos disparates em cena; se em A vila (2004), o mais bem acabado filme do realizador, os mistérios ingênuos da trama tinham algum encanto, em A dama na água o osso fílmico está ruindo.
O misticismo indiano de Shyamalan é algo meio torto e superficial, como se sabe desde O sexto sentido (1999), o máximo de seu charlatanismo; seu suspense, que alguns equipararam equivocadamente ao do inglês Alfred Hitchcock, até que é funcional. É meio complicado descartar uma realização formalmente tão bonita quanto A dama na água; mas, passado o efeito de hipnose que toda projeção de filme tem, que me dá vontade, dá.
Por
Eron Fagundes