A PÍLULA AMERICANA
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13 de dezembro de 2004

Dança comigo? (Shall we dance?; 2004), dirigido pelo artesão britânico Peter Chelsom, é a pílula americana de filmar: apesar de todas as trivialidades, previsibilidades e já-vistos possíveis, engolimos facilmente esta narrativa semimusical, tão anacrônica quanto aparentemente modernosa. O roteiro foi extraído do filme homônimo japonês rodado em 1997 por Masayuki Suo, que já continha bastantes concessões ao modo ocidental de filmar (apesar de seus contemplativos 123 minutos) e prestava suas homenagens a este gênero essencialmente hollywoodiano que é o musical sem deixar de tocar referências ao estilo europeu de filmar a dança herdado do italiano Luchino Visconti. Dança comigo, a versão americana, é uma entrega da imagem ao melodrama musicado e dançado.

Apesar de seu sucesso comercial por aqui, a realização nipônica não tinha nada de excepcional, mas conservava uma sensibilidade mais séria reverenciada por parte da crítica. O cinema americano o está reverenciando por aquilo que interessa aos americanos: a facilidade de comunicação com o público. Refazendo americanamente os episódios japoneses, o inglês Chelsom pasteuriza ainda mais a subjacente história de descoberta de personalidade que o protagonista empreende dentro dum trem quando depara, pela janela do veículo, com uma moça triste que parece olhar para ele. As aulas de dança, a atração pela moça, a volta para a família preenchem os restantes esquemas do filme.

Se Richard Gere definitivamente não é mais do que uma estrela sem luminosidade e Jennifer Lopez não passa de uma escultura erótica desprovida de sangue e furor (a despeito de suas origens latinas), é sempre bom reencontrar a grande classe interpretativa da veterana Susan Sarandon. Enfim, aí está a pílula, capaz de entorpecer os sentidos do espectador e fazê-los mergulhar no vazio quase sem remorso.

Por Eron Fagundes