22 de janeiro de 2007
Antes de mais nada, o realizador norte-americano Edward Zwick sabe filmar uma boa aventura cinematográfica, daquelas que seguram o espectador mais por seus truques formais hollywoodianos do que por aquilo que verdadeiramente têm a dizer. Isto até se evidenciava num filme tão fútil quanto O último samurai (2003), onde nossa atenção era mantida a despeito dos ridículos colonialistas da visão de Zwick.
Esta visão colonialista sobre o Terceiro Mundo não deixa de existir em Diamante de sangue (Blood diamond; 2006), mas é seguramente mais nobre e mais crítica que a investida nipônica de Zwick. Como tem ocorrido tantas vezes com o civilizado cinema ocidental, do rigoroso clássico Uma aventura na África (1952), do norte-americano John Huston, ao experimental e amadorístico Fata Morgana (1969), do alemão Werner Herzog, Diamante de sangue se debruça sobre o miserável e por vezes selvagem e violento continente africano; o que está em cena é a cruenta guerra civil de Serra Leoa, em 1990, e Zwick não poupa retratos da crueldade humana para construir uma aventura fílmica bem abotoada e inteligente.
Diamante de sangue se estrutura em torno de três personagens bem esboçadas. O mercenário branco vivido com surpreendente bravura por Leonardo DiCaprio, sempre tão cínico em sua procura de diamantes; o negro Solomon que se dispersou de sua família, foi escravo em mineração e passa toda a narrativa nesta angústia de busca dos seus; e a jornalista interpretada por Jennifer Connelly, com seu humanismo tão frágil quanto inútil. O diamante encontrado por Solomon nas minas e depois enterrado no sopé da montanha vai deflagrar a ganância da criatura de DiCaprio e provocar a repulsa da jornalista. Estas três personagens vão evoluir ao longo do filme, jogando a realização de Zwick numa dimensão que talvez não tenha sido o propósito original do realizador. Ferido de morte, o olhar e o riso irônicos e doloridos de DiCaprio para o diamante que mira longamente antes de entregá-lo a Solomon na subida da montanha, este riso não é igual mas não se pode deixar de pensar na gargalhada sarcástica que Walter Huston solta no final de O tesouro de Sierra Madre (1947), de John Huston: tanto a gargalhada de Walter quanto o riso entre debochado e constrangido de DiCaprio expressam a desorientada perplexidade do homem diante do inaudito esforço construído pela ganância e do resultado nenhum a que este dispêndio moral e físico chega.
As relações conflitivas e a posterior amizade entre um branco e um negro não é novo no cinema de Zwick, que já tratara do tema em Tempo de glória (1989), também ambientado em guerras africanas e um dos melhores exemplares do cinema deste diretor. Demais, pode-se lembrar também que DiCaprio parece talhado para morrer como herói romântico que perdura na memória da heroína: se em Titanic (1997), de James Cameron, o ator “morria” congelado em alto mar dando palavras de incentivo a sua amada, em Diamante de sangue o ator, por telefone, esvaindo-se em sangue no alto duma montanha africana, dá imponderáveis frases à jornalista que passou a amar em sua jornada. Enfim, são circuitos de simbologia hollywoodiana que enriquecem a película de Edward Zwick.
Por
Eron Fagundes