O AMOR FAZ LEMBRAR
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16 de agosto de 2004

O realizador norte-americano Nick Cassavetes ressuscita uma parte da dignidade dos dramas românticos feitos em Hollywood, depois de tantas falsificações constrangedoras. Diário de uma paixão (The notebook; 2004) está longe de ser uma obra capaz de marcar o cinema, como, por exemplo, O morro dos ventos uivantes (1939), o notável filme que o cineasta William Wyler extraiu da obra-prima da escritora Emily Brontë: os aspectos lacrimosos da realização de Cassavetes impedem aqui e ali uma aproximação à profundidade sentimental. Mas a sensibilidade de Cassavetes para driblar as obviedades de seu roteiro se evidencia, como o espectador já pôde constatar em outro filme dele, Loucos de amor (1997), que apresentava uma notável interpretação de Sean Penn como um apaixonado cuja vida conturbada tornava a paixão uma coisa muito excêntrica.

Excentricidade é o que não falta em Diário de uma paixão, cujos exageros românticos não se pejam de ofender a verossimilhança. É aí que entram as sutilezas da mão cinematográfica de Cassavetes: buscando num livro de Nicholas Sparks inspiração para uma história de amor mais ou menos convencional (moça rica e rapaz pobre e interiorano vêm a interessar-se um pelo outro), o cineasta logra tocar-nos com os episódios tão pouco ponderáveis de seu filme.

Estruturando com classe os dois níveis da narrativa (um velho conta a uma velha desmemoriada uma história de amor contida num diário, num sanatório; e a própria história de amor que está sendo contada pelo velho é transformada em imagens), Cassavetes exubera também nas sutilezas visuais, exercitando a beleza plástica e o sentimentalismo. Todavia, um dos incômodos do filme é a disparidade surgida entre os talentos dos madurões (James Garner e Gena Rowlands, preciosos) e a escassez interpretativa dos jovens (Rachel Adams e Ryan Gosling, dirigidos de maneira obtusa por Cassavetes –Woody Allen resolveu melhor o problema de dirigir jovens em Igual a tudo na vida, 2003).

Apesar de tudo, um filme recomendável para quem gosta de expor-se à catarse das paixões juvenis capazes de perdurar no ocaso da vida.

Por Eron Fagundes