01
de dezembro de 2003
O dinamarquês
Thomas Vinterberg impressionou com a crueza de um cinema feroz
e sem concessões em Festa de família (1998), um
dos filmes-marco do Dogma 95, movimento cinematográfico
que buscava um realismo absoluto da encenação pela
ausência de artifícios narrativos.
Agora,
com Dogma do amor (It’s all about love; 2003) o
realizador nórdico afasta-se da objetividade da escola
a que seu nome estava ligado, percorrendo um caminho de obscuridade
metafísica em que se cruzam influências do polonês
Krysztof Kieslowski e de antigos filmes-pesadelo de outro polonês,
Roman Polansky, para produzir uma narrativa confusa; em síntese,
algo cheio de uma pretensão apocalíptica cujo resultado
final é o vazio.
O
que está em cena é a visão das transformações
do planeta neste início de milênio: as nevascas
mortíferas em Uganda, os inesperados ataques cardíacos
em Nova York. Ligando os fios escuros da trama, um casal que
está para se divorciar não se divorcia, pois voltam
a entender-se; a personagem da mulher é o símbolo
das metamorfoses planetárias ao multiplicar-se em vários
e estranhos clones (nenhuma relação com o mal que
se multiplica em Matrix revolutions, 2003, dos irmãos
Andy e Larry Wachowski).
Se
Vinterberg fosse um David Lynch, ele poderia alegar que o que
importa em seu filme são certos estados de espírito
e não uma lógica da história. Mas a confusão
de Dogma do amor parece mais fruto da inabilidade do diretor
para o projeto que se propôs, como ocorreu com James Mangold
em Identidade (2003); é certo, porém, que Vinterberg
tem mais atributos intelectuais que Mangold, embora nada seja
suficiente para permitir ao espectador curtir com prazer sua
realização.
Por Eron Fagundes
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