A FUNÇÃO SOCIAL DO ARTISTA
 

 

25 de outubro de 2005

Lá pelas o ator Wellington Nogueira, num dos muitos excertos de entrevistas que dá para a câmara no documentário Doutores da alegria (2005), dirigido por Mara Mourão, esposa de Wellington, diz que, ao dar com um grupo de palhaços que fazia o trabalho de levantar o moral dr crianças doentes no fim da década de 80, descobriu a função social do artista e concluiu que, despojando-se de seu ego e de suas pretensões intelectuais na metrópole do mundo, Nova York, onde estudava teatro, era isto que queria fazer. Fundou a organização Doutores da Alegria, arregimentou colegas e amigos e desde 1991 promove em hospitais com crianças o esforço de dar vida a quem a está perdendo sem sequer ter começado a viver.

Doutores da alegria não chega a ser um grande documentário porque Mara, como ocorria em seu trabalho anterior, Avassaladoras (2002) não sabe manejar bem as características duma fragmentação narrativa, duma construção em episódios; o filme tem seus picos (especialmente pelo brilho inusitado de algumas situações vivenciadas pelos palhaços e pelos pequenos), mas apresenta igualmente algumas quedas quando a direção de Mara fraqueja e se torna repetitiva.

Mara é especialmente feliz na montagem de seu filme, alternando entrevistas que teorizam sobre o tema com seqüências práticas da convivência nos hospitais. Há pelo menos uma cena exemplar em criatividade: uma evocação de um fato é contada simultaneamente por dois palhaços, um homem e uma mulher; Mara coloca no quadro maior dois pequenos quadros que focalizam o homem e a mulher cada um para um canto: Mara ora dá voz a um, ora a outra, as frases de um completa a da outra e o episódio surge inteiriço diante do espectador.

Diante da força e do empenho social de Doutores da alegria, espera-se que a carreira de Mara siga este rumo e não perca tempo e celulóide – ou qualquer outro suporte — fazendo uma obra tão escapista quanto Avassaladoras, que servia mesmo para ajudar a erigir astros televisivos como Reinaldo Gianecchini e Giovanna Antonelli.

Por Eron Fagundes

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