O CONTROLE DIGITAL DO MUNDO
 

 

13 de agosto de 2007

Pode ser que Duro de matar 4.0 (Live free or die hard; 2007), dirigido por Len Wiseman (mais um dos tantos nomes-instrumento do cinema de fantasia e ação de Hollywood), tenha o mesmo destino das realizações anteriores da série: o espectador curte o clima de tensão da narrativa, mas logo depois da saída da sala de exibição começa a jogar o filme em seu esquecimento cinematográfico (arquivo abarrotado depois de décadas de cinefilia, mas onde sempre cabe mais um). Mas, visto agora, neste momento crucial do mundo e do cinema, o novo filme rodado para o estrelismo de Bruce Willis parece ser bem mais interessante que seus antecessores, pela dose de observação, tão sarcástica quanto divertida, sobre certas realidades das sociedades humanas de hoje. Quando o norte-americano John McTiernan realizou o primeiro filme da série, em 1988, o cineasta, os produtores e seu astro central (que é na verdade o verdadeiro dono destes filmes) não pretendiam mais que exercitar um tipo de ação cinematográfica que pudesse angariar o gosto das platéias de então; assim, o primeiro Duro de matar se inseria numa série de produções americanas do final dos anos 80 que captavam a intranqüilidade originada da violência que cercava o homem das grandes cidades da época.

Quase vinte anos depois, Duro de matar 4.0 é o filme da série que vem depois do 11 de setembro de 2001, quando a ousadia demente de terroristas árabes pôs quase em xeque-mate a inexpugnável segurança da mais rica sociedade do planeta. E este novo filme traz um questionamento terrível: que segurança pode ter um mundo em que qualquer maníaco pode criar pânico por uma rede digital? Quase todo o furor de violência de Duro de matar 4.0 é feito digitalmente: as explosões à antiga vêm a reboque. É bem verdade que Bruce e sua turma não se rendem inteiramente aos aspectos disformes e longínquos de um cinema meramente digital, como em Transformers (1007), de Michael Bay, pois no filme de Wiseman e Willis não se abdica das velhas formas de impacto das cenas de ação, com sua impressão epidérmica sobre o espectador, conferindo um ultra-realismo às mais descabeladas fantasias (como o carro que alça vôo atingindo um avião em pleno ar).

Uma das seqüências mais curiosas e divertidas do filme é aquela em que os vilões manipulam um noticiário televisivo usando e alterando discursos de diversos presidentes norte-americanos. A fala desarticulada dos mandatários de Estado é provocativamente irônica e danadamente simbólica, querendo dizer, arrisquemos um pouco, que os “monólogos” presidenciais, por trás de suas mensagens de segurança, são orações vazias e impotentes  diante dos perigos; alguém lembra dos palavreados de George Bush após os atentados de 11 de setembro de 2001?

É bem verdade que Duro de matar 4.0 é, em sua grossa parte, pura indústria do entretenimento. Mas creio que vale a pena, nem que seja pelos 10% que sobram, meditar sobre estes seus dizeres subliminares.

Por Eron Fagundes

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