22
de novembro de 2005
À medida
que a projeção de Tudo acontece
em Elizabethtown (Elizabethtown; 2005), de Cameron Crowe,
desfilava diante de meus olhos, pensei, meio aleatoriamente,
num filme dos anos 70, Ensina-me a viver (1971),
de Hal Ashby. Nesta antiga película americana
uma velha muito alegre vai empurrar para cima a melancolia
suicida de um garoto com quem se relaciona ao longo
duma narrativa cômico-trágica. O filme
de Ashby está muito longe de ser um verdadeiro
bom filme daqueles anos, mas tem uma energia que
falta à realização de Crowe:
fazendo com que se cruzem em cena uma garota animada
e um rapaz deprimido pelos azares da vida, Crowe
narra seu filme com a tibiez de sua personagem masculina.
Dizem
os noticiários cinematográficos
que o cineasta trouxe para o roteiro de sua fita
experiências de sua própria vida, como
a perda do pai. Sabe-se que não basta ter
em mãos a vida para rodar um filme sincero. É preciso
ser um diretor de cinema de verdade, capaz de transformar
seus episódios particulares em cenas fílmicas
autênticas. Não é o que acontece
em Tudo acontece em Elizabethtown: as formas incaracterísticas
da montagem e do enquadramento, os tons postiços
do melodrama pretendido levam a produção
ao desastre; Crowe não consegue safar-se do
fiasco, ao contrário do que ele impõe à criatura
vivida apaticamente por Orlando Bloom (sua parceira
Kirsten Dunst não lhe fica atrás em
opacidade).
Curiosamente,
Tudo acontece em Elizabethtown se vale de todos os
grandes temas que fizeram a glória
de cineastas maiores: o aprendizado sentimental,
a ironia de nosso destino quando confrontado com
nossos desejos. Mas Crowe oculta estes temas atrás
dos clichês: as soluções fáceis,
a incapacidade de impor os conflitos espirituais
das personagens, a navegação por enredos
mornos diante da ausência do que dizer. Quando
o filme carece de inteligência verbal (algo
amiudado ao longo da projeção), Crowe
extirpa da faixa sonora as vulgaridades ditas pelas
criaturas e inunda nossos ouvidos com uma música
agitada mas repetitiva.
Sobra
pouca coisa. Talvez a desenvoltura da grande atriz
Susan Sarandon que dá um charme diferenciado
ao patético bobo da mãe do protagonista.
Ashby,
que nunca foi um grande realizador, poderia ensinar
os artesãos de hoje a fazer filmes
melhores.
Por
Eron Fagundes