03 de outubro de 2006
A velhice tratada em imagem cinematográfica é um assunto que já teve seus filmes definitivos. Citando a esmo. Era uma vez em Tóquio (1953), de Yasujiro Ozu, acompanhando o cotidiano de um casal de idosos na fria e distanciada Tóquio dos anos 50, é o mais belo filme japonês da história. Morangos silvestres (1958), do sueco Ingmar Bergman, não é bem sobre a velhice, mas se debruça sobre a figura de um velho médico para suas agudas reflexões. É todavia em Umberto D (1951), do italiano Vittorio De Sica, pequenos acontecimentos na vida de um aposentado do pós-guerra peninsular, que a velhice adquire seu contorno fílmico mais notável: é a obra-prima da velhice por excelência. O cinema brasileiro também fez seus belos filmes sobre velhos: de Chuvas de verão (1978), de Carlos Diegues, a O outro lado da rua (2004), de Marcos Bernstein, os últimos brilhos do crepúsculo humano mereceram a ternura dos cineastas.
Durante a projeção de Elsa e Fred (Elsa y Fred; 2005), filme dirigido pelo argentino Marcos Carnevale, eu pensava em toda esta pesada bagagem cinematográfica. Pesada sobretudo se o observador considerar a ambição extremamente minúscula da realização de Carnevale. Fazer narrativas que tratem de velhos é como fazer narrativas sobre crianças: são assuntos que despertam a simpatia e a compaixão do público. Como desrespeitar os idosos? Como não se enternecer com os pequenos? Elsa e Fred é um daqueles filmes que, enquanto estamos na sala escura vendo-o, parecem segurar-nos firmemente o coração, tão firmemente que podemos imaginar ser difícil desligar-se desta mão que nos aperta as veias coronárias; porém, à medida que o tempo se afasta das impressões primeiras provocadas pela projeção, a pobreza estética e a escassez de autênticas emoções de Elsa e Fred se abre como uma ferida que hesitamos em investigar.
Por que isto? Não há aparentemente nada de errado com o filme. E este nada de errado talvez seja seu principal erro. A narrativa de Elsa e Fred é como a personagem do idoso-homem, tudo muito ajustado, muito correto, excessivamente medido em seus efeitos; Elsa e Fred é, estilisticamente, contado do ponto de vista do velho (frio, mecânico, burocrático) e não do ponto de vista da velha (solta, irreverente).
A uruguaia China Zorrilla e o espanhol Manuel Alexandre são os principais trunfos dos aspectos bem-sucedidos do filme: intérpretes extraordinários. Debruçando-se sobre um conflito de caracteres de maneira mais elaborada que aquela forma hollywoodiana de O diabo veste prada (2006), de David Frankel, Elsa e Fred está longe de tornar problemáticos e agudos os severos temas que aborda.
Por
Eron Fagundes