04 de abril de 2008
O realismo cênico e uma repuxada beleza plástica dão o tom narrativo de Exuberante deserto (Adama Meshuga’at; 2006), filme israelense dirigido por Dror Shaul. Ambientado num kibutz (comunidade agrícola israelense), a realização lembra a contemplação do cotidiano tal qual é feita nas obras do italiano Ermano Olmi; mas, diferentemente de Olmi, falta a Shaul o autêntico sentido de cinema capaz de retirar de Exuberante deserto o ritmo rançoso de encenar, estes grãozinhos formais que provocam no espectador mais descaso do que paixão. Ocorre com Shaul o mesmo que se deu com a brasileira Sandra Kogut em Mutum (2007): a honestidade de filmar é exemplar, os assuntos são ricos e importantes, mas uma mão deformada de cineasta impede o aparecimento da emoção.
Como no filme brasileiro, é a visão de um menino dos rincões perdidos que vai conduzir a consciência narrativa. Este menino vê com perplexidade o precário universo que o rodeia: a demência da mãe após o suicídio do pai, a prática de sexo com animais, as instabilidades da sala de aula, a quase ausência de perspectiva de mudança numa vida estagnada. Shaul vai anotando tudo como um cronista de sua aldeia e vê-se que ele sabe do que fala, e ao falar cultiva sua própria sensibilidade. Mas esbarra naquela distância que vai entre a vida e o cinema, mesmo que este cinema se despoje do espetáculo, como acontecia nos filmes neo-realistas, cuja herança esta fita israelense busca resgatar.
Por
Eron Fagundes