UM ÉPICO CHINÊS
eron@dvdmagazine.com.br

21 de março de 2005

A filmografia do cineasta chinês Zhang Yimou tem oscilado entre imponentes épicos históricos (O sorgo vermelho, 1987; Lanternas vermelhas, 1991) e, recentemente, esboços do cotidiano de seu país (Nenhum a menos, 1998; O caminho para casa, 1999). Seu atual Herói (Hero; 2002) se coloca no primeiro grupo: uma epopéia opulenta dum tempo perdido na ancestralidade da China. O que dá coerência e unidade à obra cinematográfica de Yimou é a obsessão do cineasta pela beleza pictórica das imagens e a obsessão de suas personagens por desejos tão transparentes quanto insistentemente persuasivos diante do olhar atônito do espectador que poderá ter alguma dificuldade em aceitar certas ingenuidades dos projetos das criaturas em cena.

Driblando com mais habilidade que o japonês Takeshi Kitano em Zatoichi (2003) as armadilhas da esterilidade formal, Yimou confere a Herói um ânimo vital que às vezes chega a apaixonar o observador. Exacerbando no cromatismo de sua linguagem cinematográfica (o espírito dos blocos narrativos do filme é ditado pela predominância de certas cores: vermelho, uma cor favorita do cineasta; azul claro, verde claro, branco, preto), articulando com sinuosidade a coreografia audiovisual de certas seqüências de batalha, Yimou segue fazendo em Herói um cinema raro, revelando a mesma vitalidade surpreendente que descobri, deslumbrado, ao ver seu filme O sorgo vermelho em novembro de 1988 num Festival de Cinema do Rio de Janeiro. Yimou é saúde cinematográfica num tempo em que as imagens doentes e precárias são muitas.

Por Eron Fagundes