O CINEMA CONTAMINADO
 

 

30 de julho de 2007

O hospedeiro (Gwoemul; 2006), filme sul-coreano dirigido por Bong Joon-ho, digere muito mal o gosto do espetáculo cinematográfico ocidental pelos grandes efeitos visuais e pela palhaçada cênica misturado com uma exasperante narrativa “amarela”, isto é, oriental: curiosamente, é um objeto amarelo que vai destruir o monstro marinho nascido do lixo tóxico no fim do filme. A armação fílmica de Joon-ho não se sustenta muito bem, e as pretensões sérias e críticas da realização (sobrando inclusive para o imperialismo americano) esbarra na trivialidade e nas concessões comerciais a que seguidamente o filme se entrega.

Há alguns anos, outro filme oriental, o taiwanês O rio (1997), de Tsai Ming-Liang, tratava de viés o caso dum rapaz que servira de extra numa filmagem num rio poluído e adquirira uma deficiência óssea. Mas entre o cinema duro, engessado de Joon-ho e a autêntica e elástica inventividade de Ming-Liang (diretor de um dos mais belos filmes vistos em 2007 em Porto Alegre, O sabor da melancia, 2005) vai a distância que separa um cinema consistente de um cinema de formas vagas a tateantes de filmar; o tateante e o inseguro em Joon-ho não significa soltura para atingir a criatividade, como nos antigos trabalhos da nouvelle vague, mas um enrijecimento das relações entre as imagens que, procurando tapar a insegurança do realizador, abole qualquer invenção formal fora dos manjados efeitos à Hollywood (monstros risíveis de um lado e de outro ingênuos e assustados seres humanos tratados de maneira estereotipada pela fita).

Creio que o sucesso comercial e junto a alguns críticos de uma obra tão fraca como O hospedeiro se deve às preocupações sociais de hoje com a contaminação dos rios. Mas O hospedeiro, no plano do cinema, contamina o visual fílmico de maneira tão terrível quanto sua violenta e exótica criatura marinha.

Por Eron Fagundes

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