O FUTURO BATE À PORTA: POBRE FUTURO
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15 de agosto de 2005

Antigamente os filmes de ficção científica projetavam suas projeções futuristas para décadas ou séculos adiante. Por exemplo: o cineasta norte-americano Stanley Kurbcik ia ao ano de 2001 numa obra-prima rodada em 1968, 2001: uma odisséia no espaço. Hoje, como os avanços da ciência jogam o futuro na nossa porta, um filme como A ilha (The island; 2005) se atira somente alguns anos para a frente: sua história se passa em 2019, quinze anos depois do momento em que seus primeiros espectadores o vêem nas poltronas dos cinemas; mas a realidade da clonagem de seres vivos, se ainda não é o nosso cotidiano, é algo tão perto e tão palpável que foge à questão da simples fantasia futurista.

Mas a atmosfera da realização de Michael Bay é de uma obra futurista. E Bay é um realizador extremamente falso neste aspecto: sua fútil grandiloqüência de filmar (desde as rasantes panorâmicas aéreas das primeiras imagens repetidas em parte no fim) e sua montagem artificiosa e mal distribuída causam dor na inteligência do observador; então, ciente do fracasso de sua incursão por um tema perigoso, Bay se rende à única coisa que ele sabe fazer: explodir cenários e movimentar personagens em toda a disparada no surrado (mas sempre eficiente) artifício de fuga e perseguição; a cada meia hora de projeção, depois dos enfados das superficiais discussões sobre a natureza da clonagem, Bay insere suas óbvias correrias.

Tentaram ver na película de Bay certos indícios do sofisticado pensamento de antecipação do escritor inglês Aldous Huxley. Mas o público de Bay tem certamente relações com as espantosas atrocidades visuais de O dia depois de amanhã (2004), do alemão Roland Emmerich; tal público de maneira alguma teria condições de freqüentar o refinamento de idéia dum autor como Huxley. Hollywood por via de regra filma mal atualmente e engolir seus truques cada vez mais primários é sintoma da miopia de ver que grassa hoje em dia. É claro que esta observação é antipática aos olhos desta platéia amorfa que simula um clone daquilo que a indústria projeta em laboratório: modelar os cérebros para converter a produção de filmes num simples negócio (assim como faz o vilão do filme com as vidas de sua colônia de clones).

As interpretações não ajudam muito. Ewan McGregor está entre o displicente e o exagerado, como habitual. E Scarlett Johansson, apesar de seu tipo diferenciado (assim como Angelina Jolie, Scarlett chama a atenção por uma expressão facial característica e pela saliência dos lábios), não está tão bem quanto estava em Em boa companhia (2004), de Paul Weitz, um filme também medíocre mas que era valorizado pela aparição da jovem atriz. Seja como for, o estilo de filmar de Bay, onde o que importa é a imponência das imagens, vai sempre desprezar o interesse pelos atores.

Por Eron Fagundes