02
de maio de 2005
Creio
que o projeto cinematográfico do realizador norte-americano
Sydney Pollack sempre foi o de rodar entretenimentos que não
machucassem a inteligência do espectador. Em seu novo filme,
A intérprete (The interpreter; 2005), o cineasta está afinadíssimo
com a linguagem fílmica e as preocupações
temáticas deste princípio de milênio. Afinado
e afiado como raramente tem estado em sua irregular carreira.
Se o observador se der o trabalho de rever Os três dias
do Condor (1975), um dos mais característicos trabalhos
de Pollack, dará com as modificações que
o cinema de Hollywood tem sofrido ao longo dos anos: a narrativa
mais lenta daquele clássico contrasta com a agilidade
fácil do filme atual. De qualquer maneira, um pouco como
um artesão da meca do cinema, Pollack vale-se da câmara
como um brinquedo quase infantil: há um tanto de ingenuidade
nos gestos de esconde-esconde das personagens que vivem um pretensamente
sério drama de espionagem. Mas Pollack não é um
simples artesão; embora o coloquem exageradamente como
autor, ele de fato tem alguma mais forte que o livra da categoria
artesanal, os rabiscadores de imagens.
É
problemático saber se A intérprete poderá aspirar à sobrevivência
de Os três dias de Condor. Na década de 70 o filme
de Pollack parecia fadado a sucumbir logo que seu jeito de filmar
e seus assuntos não fizessem mais sentido; mas já lá vão
trinta anos e debruçamo-nos sobre aquela película
surpreendidos com algumas de suas sutilezas. A intérprete talvez não chegue a tanto; mas é um espetáculo
que, hoje, funciona bem.
A
trama internacional exposta por Pollack retira boa parte de sua
força do dueto interpretativo entre Nicole Kidman
e Sean Penn; ele é habitualmente um bom ator, mas Nicole,
fraca em muitos filmes, topa nas mãos de Pollack um diretor
hábil para harmonizar beleza e dramaticidade em suas aparições.
O que pode prejudicar o resultado final de A intérprete são os apressados clichês com que o roteiro busca
explicar o comportamento das personagens a partir de questões
pessoais mal enxertadas no enredo. Mesmo assim, Pollack tem o
dom do cinema (à maneira americana) para nos fazer engolir
com prazer até suas mancadas.
Por Eron Fagundes
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