28 de abril de 2008
Diretor do sensível O tango de Rachevski (2003), o alemão Sam Garbarski vai mais longe na busca duma sensibilidade provocativa em Irina Palm (Irina Palm; 2007), a estranha e inusitada história duma avó que, diante da inevitabilidade duma doença de seu pequeno neto, acaba, inesperada e constrangidamente, vindo a virar masturbadora de homens num clube noturno para conseguir dinheiro para a viagem à Austrália onde o tratamento poderá ser feito. Houve quem reclamasse da verossimilhança da história, queixando-se de que não seria possível de que uma idosa dona-de-casa pudesse ter as habilidades manuais edificadas pelo filme; esta opinião é especialmente preconceituosa e só cabe nas frases daqueles para quem a conduta humana se dá sempre em linha reta e obedece a lógicas estereotipadas. Houve também quem se queixasse do possível caso amoroso entre a protagonista e seu cafetão; não me parece que este detalhe do roteiro desvie o filme para o escapismo que lhe anunciaram os observadores deste pormenor. È na verdade uma utilização de um conceito de verossimilhança aplicado aos romances do século XIX e que o próprio Honoré de Balzac ia destruindo com suas volúveis tramas.
Antes de mais nada, Irina Palm é um sopro na hipocrisia moral. Se não chega a ter a virulência visual de Shortbus (2006), de John Cameron Mitchell, com escassas exibições marginais em Porto Alegre e um dos eventos da programação de cinema do ano, isto não é um impedimento para que a provocação do filme seja enérgica; um jornalista gaúcho acusou o filme de não mostrar uma cena que fosse em que Maggie estivesse com a mão na genitália do freguês, o que revela a superficialidade do analista, algo que se assemelha a um queixoso voyeur de fitas pornográficas.
Irina Palm é um filme até mais forte do que O tango de Rachevski. Em seu novo trabalho, Garbarski, como Mitchell em Shortbus, é irônico e perverso, debochando constantemente dos conceitos sociais; se não chega à criatividade extremada de Mitchell, não é porque seja menos agressivo sexualmente, mas porque a ousadia de Mitchell é única em Shortbus. Mas Irina Palm é uma obra acima da média da produção corrente e tem seus momentos de notável comoção. Entre estes momentos, aquele em que a protagonista e sua nora se abraçam, apesar das diferenças, a nora grata à sogra pelo sacrifício desta em favor do menino: é o abraço de duas mães, uma destas avó.
O caminho da protagonista é pedregoso, não bastassem seus desvios e inquietações morais. Ela faz com que a garota que a ensinou no ofício masturbatório perca o emprego; ela tem de enfrentar a ira de seu filho quando este descobre como estava obtendo o dinheiro para o tratamento do neto.
Marianne Faithful, a atriz que vive a avó, foi namorada de Mick Jagger e Keith Richards, componentes do grupo musical Rolling Stones, está adequada, física e psicologicamente, no papel da avó. É capaz de transmitir a perplexidade daquela senhora diante de seu próprio caminho.
Por
Eron Fagundes