04 de abril de 2008
O realizador norte-americano Doug Liman quer trafegar com idêntica naturalidade na porção industrial do cinema e naquilo que a indústria pode permitir à manifestação da inteligência narrativa. Jumper (Jumper; 2008) é o filme mais bem sucedido de Liman, uma aventura infanto-juvenil em que, se o espectador se desligar das noções costumeiras de inteligência ou bom-senso, pode desfrutar de um entretenimento forte e agradável de ver. Num de seus primeiros trabalhos, Vamos nessa (1999), Liman exercitava um curioso experimentalismo comercial, mexendo os pontos de vista que chegavam ao espectador; seu megasucesso Sr. e srª. Smith (2005) era artificioso demais e preenchido com demasiada facilidade pelos astros Brad Pitt e Angelina Jolie; em Jumper, desequilibrando todas as verossimilhanças, Liman equilibra a naturalidade jovem de suas fantasias.
Em Jumper o cineasta tenta propor à platéia uma viagem sem limites. O protagonista, David Rice, é um “jumper”, um garoto que desde a infância descobriu que é capaz de “saltar” de um lugar para outro do mundo num instante tão breve quanto o pensamento ou o desejo; as trucagens para esta situação fantasiosa são bem-feitas por Liman e sua equipe, a despeito da necessária ingenuidade de todo o aparato. Sem apelar para os excessos digitais hoje em voga, Liman filma em Nova York, Paris, Tóquio, Praga, Egito, não por escrúpulos realistas (seu filme é uma fantasia libérrima), mas por amor à autenticidade visual do cinema.
Hayden Christensen vive a personagem central, Jamie Bell interpreta o outro “jumper” com que Rice topa e Rachel Bilson está na pele de Millie, a namoradinha que corre mundo com seu “jumper”; é um trio de intérpretes com os inevitáveis tropeços da linha interpretativa juvenil, mas com uma naturalidade cênica que escapou a Sr. e srª Smith, o estrelismo estorvante de Brad e Angelina. Entre as aparições maduronas, o ator negro Samuel L. Jackson como um “caça-jumpers” (chamados paladinos) e Diane Lane (vista em Infidelidade, 2002, de Adrian Lyne, como a esposa que guampeia Richard Gere) como a mãe do protagonista (ela é uma paladina e abandonou seu filho para não ter de matá-lo) desempenham com desenvolta ironia seus papéis.
Se o espectador for generoso (quiçá generoso demais) poderá ver nos embates entre “jumpers” e paladinos a eterna refrega entre rebeldes ousados e os repressores ao longo da história; alguém chega a falar na Inquisição num diálogo do filme. Mas aí a metáfora é excessiva e a inteligência não a sustenta. É um divertimento esperto tão-somente.
Por
Eron Fagundes