A PROVOCAÇÃO ERÓTICA
 

 

18 de outubro de 2005

Bem no começo de Lila diz (Lila dit ça; 2004), produção francesa dirigida pelo árabe Ziad Doueiri, uma esplendorosa garota loira volta-se para a câmara e diz (para a câmara, para um interlocutor fora do quadro, para o espectador): “Você quer ver minha xoxota?” A atmosfera erótica trazida à narrativa de Lila diz pela figura arrebatadora da jovem vivida pela sensual francesa Vahina Giocante é provocante e provocativa; o filme na verdade trata dum rapaz meio diferente de seus amigos grosseiros, um ser que vive escrevendo e, ao dar com a bela garota, se arrepia contidamente, um arrepio que ultrapassa a mera questão física; a paixão que o envolve com Lila é tanto erótica quanto visceralmente de alma.

A narrativa do filme assume o anacronismo de suas personagens centrais; a sensibilidade que os conduz é certamente fora de moda num mundo em que também o sexo se rende a uma das muitas formas de violência e grosseria. Lila e Chimo são pessoas diferentes entre si que se atraem inapelavelmente, pólos que se completam na energia do mundo; Lila provoca, diz coisas sexualmente arrojadas, Chimo é cheio de pudores, seu medo choca-se com a aparente vulgaridade da garota; um vulcão de sentimentos se forma imperceptivelmente em torno das duas personagens.

Lila diz traz de algum jeito um contraponto à outra evocação cinematográfica do despertar do sexo numa adolescente. A figura da garota do filme argentino A menina santa (2004), de Lucrecia Martel, ao sentir-se atraída por um esquivo homem mais velho que a deseja silenciosamente, é surdamente invadida por seus conflitos entre Deus (ela fez os votos iniciais de freira num convento) e Eros; mas este se salienta sempre. Lila se vê despertada em seus demônios sexuais por um garoto tímido, que a intriga e a leva a usar de suas fantasias (que não correspondem à carruagem de sua vida) para provocá-lo a andar mais depressa. Se a realizadora argentina é mais profunda e perturbadora nos cruzamentos temáticos que elabora, Doueiri não deixa de adotar aquela beleza de sensibilidade francesa de filmar que nos encanta até o fim.

Por Eron Fagundes

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