21
de fevereiro de 2006
Antes
de mais nada, é bom salientar que Memórias
de uma gueixa (Memoirs of a gheisa; 2005) realiza
o cinema do espetáculo visual e dançado
de maneira muito mais interessante e inventiva que
o filme anterior do diretor Rob Marshall, Chicago (2002). Marshall acredita acima de tudo no rebuscado
da encenação cinematográfica;
e este rebuscado é muito hollywoodiano, chega-se
a um academicismo formal que as características
estonteantes do visual se esforça por encobrir:
em cada cor, em cada angulação da câmara,
em cada movimento do quadro, em cada gesto ou fala
dos intérpretes (algo acentuado pelo inglês
carregado de atrizes orientais) esta coisa de, “eis
o espetáculo, aqui se encena” está presente;
o artificialismo é buscado adrede pelo cineasta,
não é um defeito de quem não
sabe filmar, não se trata de ausência
de senso fílmico: a questão é simples,
ou se aceita o jogo cinematográfico, ou se
cai fora logo, pois a narrativa se alongará bastante
sem mudar de perspectiva.
O
jogo proposto por Marshall em sua história
ambientada no Japão das décadas de
20 e 30 é curioso e vem de um livro de Arthur
Golden. Marshall, como bom aprendiz de Hollywood,
deixa de lado as complexidades culturais e humanas
para se deter na superfície brilhosa do espetáculo;
que filme o italiano Federico Fellini faria se residisse
em Hollywood, adaptando-se? Creio que não
ficaria longe dos maneirismos de Memórias
de uma gueixa. Fellini parece ser a mais escancarada
influência de Marshall, especialmente um dos
filmes menos citados do genial italiano, Ginger
e Fred (1985), onde igualmente intérpretes patéticos
dos espetáculos interioranos desfilavam ante
luzes feéricas. Mas o que falta a Marshal é a
capacidade de converter uma aparente alienação
visual num sopro poético e crítico.
Memórias de uma gueixa não merece nem
desprezo nem êxtase: como a gueixa que protagoniza
o filme, podemos queixar-nos de certas dificuldades
de transpor fronteiras existente na narrativa; mas
também como a gueixa, podemos pensar, vá lá,
nem cortesã nem esposa, mas quem sabe meia-esposa
.
Por
Eron Fagundes