ORALIDADE MAL RESOLVIDA
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24 de maio de 2004

Uma oralidade cinematográfica mal resolvida pode dar numa narrativa tão falsa quanto um discurso empolado que se coloque na boca de pessoas simples. Em Narradores de Javé (2003) se evidencia a inabilidade da cineasta Eliane Caffé para lidar com os elementos aleatórios do cinema, como a improvisação dos intérpretes e a utilização de atores amadores, numa atualização meio precária e popularesca das técnicas do neo-realismo. Em seu filme anterior, Keoma (1998), Caffé já saía a buscar uma voz de interior para dar seu recado; em Narradores de Javé ele vai um passo adiante nesta estranheza de linhas, mas resvala na má disposição dos elementos cênicos.

Perde-se o ritmo narrativo, desfaz-se o sabor mais fresco anunciado no início e o ranço naturalista acaba por aborrecer. Lamenta-se o grande desperdício de talentos interpretativos. José Dumont mostra novamente que é um ator de grande força. E Nelson Xavier não lhe fica atrás. Mesmo as faces não-profissionais são curiosidades. O problema é de outra natureza: o roteiro molenga e uma direção pesada e disforme.

Caffé está esforçando-se, é verdade. Mas seu filme desagrada ao analista por suas deficiências formais e temáticas. E não deve cair no gosto do público por sua provocativa (ainda que mal usada) desglamurização.

Por Eron Fagundes