12
de janeiro de 2004
O cinema
do francês Bertrand Blier sempre esteve afeiçoado
a um exercício de improvisação que nasce
dos diálogos e das interpretações e pode
produzir narrativas formalmente excitantes e criativas dependendo
do rigor com que o cineasta se dispõe a tratar sua barafunda
improvisada. Em Corações loucos (1973) a irreverência
de Blier centrava-se na sexualidade provocativa. Em Linda
demais para você (1989) o experimentalismo estilístico
do realizador atingia seu paroxismo.
Não me parece que Os
atores (Les acteurs; 2000) vá além
duma brincadeira, uma realização em família
(por que Blier não poderia rodar seu trabalho no anacrônico
e amadorístico Super-8?) onde o veterano diretor reúne
alguns astros já meio decadentes do cinema francês
mas ainda com uma extraordinária capacidade interpretativa.
Desfilam em situações muito triviais André Dussolier,
Michel Serrault, Gérard Depardieu, Jean-Paul Belmondo,
Alain Delon, Jean-Claude Brialy, Michel Piccoli, Pierre Arditi.
Uma visão do astro como astro, uma visão do astro
como ser humano comum: da dialética destes dois pontos
Blier extrai o melhor de seu filme, uma pretendida reflexão –desde
a cena inicial no restaurante, em enforcados primeiros planos,
quando um ator pede a um garçom um pote d’água
quente e não é ouvido ou atendido—sobre a
necessidade de visibilidade exigida pela vaidade do ator: “quando
um ator não é ouvido, ele está perdido”,
reflexiona melancolicamente aquele que foi vítima da situação
embaraçosa.
Talvez
os ares de reflexão não façam bem
a esta brincadeira divertida, simplória em suas colocações,
um espetáculo cômico belamente interpretado. Freqüentemente
a improvisação exposta diretamente por Blier perde-se
em liames metalingüísticos ineficazes, frouxos. De
qualquer maneira, o ano cinematográfico em Porto Alegre
vai-se iniciando com algo diferente no seio da programação
habitual: é o que Os atores é (um filme diferente)
acima de tudo.
Por Eron Fagundes
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