27
de fevereiro de 2006
Hany
Abu-Assad é um diretor de cinema palestino
cujo local de nascimento é a polêmica
nação de Israel e cuja residência é a
Holanda. A formação humana e cinematográfica
de Abu-Assad é, pois, marcada fortemente pelos
conflitos extremamente sanguinários entre árabes
e judeus na geografia de Israel e pelas características
itinerantes e apátridas do povo a que o indivíduo
Assad pertence. Esta radicalidade de vivência
se reflete na forma cinematográfica exposta
ao longo da narrativa de Paradise now (2005); em
todos os momentos do filme a secura documental do
plano cinematográfico e o rigor de uma concepção
política do cinema se refletem nesta desconsolada
ausência de concessões que um distante
espírito palestino pode produzir na tela.
Abu-Assad
situa-se, esteticamente, no lado oposto daquele cinema
de massa e imponente do norte-americano
Steven Spielberg em Munique, onde igualmente as exasperações
entre árabes e judeus na Palestina são
objeto da câmara cinematográfica a partir
que houve nas Olimpíadas de Munique em 1972.
Abu-Assad vai tratar em seu filme da figura do homem-bomba
palestino; Assad é suficientemente hábil
para humanizar um ser que aos olhos ocidentais se
aproximaria dum monstro, e é de se louvar
a naturalidade com que o cineasta põe ao lado
das coisas do cotidiano esta situação
de exceção, um homem que em nome duma
causa vai explodir-se ao mesmo tempo em que explode
seus inimigos.
Há pelo
menos um momento em Paradise now em
que o filme se converte num puro documentário.
Said está a bordo dum carro pelas ruas; a
câmara, como captando o olhar verdadeiro da
personagem, olha para fora, é como se o diretor
deixasse de construir sua ficção e
enxertasse ali cenas documentais de pessoas em atividades
normais, sem liames dramáticos.
Curiosamente,
num filme sobre tensão e explosão,
a explosão não está em cena.
Abu-Assad despojou seu filme de violência.
O que torna esteticamente seu filme mais violento
do que os tons explícitos de Munique.
Pode-se
reprovar a Abu-Assad certos maneirismos que impedem
sua linguagem cinematográfica de atingir
uma plenitude mais profunda. Mas Paradise
now é,
bem mais que Munique e suas teias de hipocrisia que
a habilidade de Spielberg oculta, uma “oração
pela paz”.
Por
Eron Fagundes