10 de dezembro de 2007
O cinéfilo gaúcho André Kleinert disse que sentiu resistência a deslocar-se para o cinema onde se exibia Piaf —um hino ao amor (2007), dirigido por Olivier Dahan, ao ouvir um grupo de senhoras idosas exclamar: “Que filme lindo!” Entendo: eu também tardei em conferir o filme suspeitando de um sentimentalismo próprio de senhoras frágeis e excessivamente educadas: a “lindeza” de um filme assim seria necessariamente superficial e dramaticamente estereotipada. Não sei se, agora, estou em idade de ter preconceitos etários, mas há muitos anos, num Festival de Cinema do Rio de Janeiro, eu então com meus trinta e três anos, dei com uma cena que me causou um asco perigosamente soberbo: depois da exibição de O mestre da música (1988), do belga Gerard Corbiau, um grupo de senhoras entre a meia-idade e a velhice mesmo se aproximou do realizador, um elegante senhor presente à mostra, para em polido francês tecer elogios desmesurados à elegância fútil e vazia do filme belga; pretensiosamente, eu questionava se aquelas refinadamente tolas mulheres cariocas entendiam de cinema, falavam de cinema como se estivessem comentando a última moda do guarda-roupa parisiense. Hoje esta empáfia da juventude não me passa pela cabeça (embora muita gente que lê meus textos sobre cinema, especialmente os que não me conhecem pessoalmente, me julgue prepotente em minhas opiniões). Mas resistir a ver um filme como Piaf é, meio por baixo do pano, estimular estes velhos preconceitos: filme para velhinhas. Como Elsa e Fred (2005), do argentino Marcos Carnevale. Pelo menos já não estou sozinho nesta conduta: aí está meu amigo André.
Piaf lembra um pouco o cinema do francês Claude Lelouch. Apesar de suas idas e vindas entre os diversos tempos narrativos (passado, passado mais antigo, imaginação, maturidade, meninice, velhice, tudo mal costurado pela forma), o filme é executado muito academicamente: tudo é muito fosco, e como estamos longe das profundidades temporais do francês Alain Resnais e do espanhol Carlos Saura. Não se diz isto para humilhar Dahan, mas para estabelecer seus limites, que ele a todo o momento ambiciona ultrapassar. Lembra Lelouch, como disse, e é bom referir um antigo filme deste realizador (outro artista para velhinhas?), Edith et Marcel (1983), outro filme que trata da diva do canto francês. Dahan atualiza Lelouch, mas não o melhora, repetindo seus desastres.
Edith Piaf, a grande voz francesa dos anos 50, merecia melhor sorte no cinema. O melhor do filme é curtir a extraordinária voracidade vocal de Piaf, que a dublagem facial e gestual da intérprete central Marion Cotillard (em desempenho correto) não chega a comprometer. A tenacidade artística de Piaf não é analisada pelo cineasta; o que está em cena é uma visão piegas da infância sofrida e dos lances trágicos (como o amante morto num acidente aviatório) da vida da personagem. É claro que não se alteram fatos da vida de um biografado; mas, dependendo do público a que se visa, o tratamento cinematográfico se diferenciará.
Por
Eron Fagundes