PARA DEVORAR A IMBECILIDADE DO ESPECTADOR
 

 

18 de julho de 2007

Deveria  evitar ver coisas como Quarteto fantástico e o surfista prateado (Fantastic four: rise of the silver surfer; 2007), dirigido por Tim Story, talvez um dos piores diretores de cinema da atualidade. Deveria evitar escrever sobre o filme por que o texto tende a contagiar-se com a mediocridade da realização. Mas sou um viciado; e sabemos todos que o vício é um impulso irrefreável: só um tratamento radical, num isolamento absoluto de imagens e palavras, pode curá-lo. Vícios: depositar constantemente meus olhos sobre uma tela de cinema para que o cérebro (ali está também o coração, quem não sabe) se exercite; depositar-me sobre uma folha em branco para alinhavar coisas sobre filmes.

Qualquer espectador —o mais humilde, o mais despretensioso— xinga o filme de que não gosta: isto é uma merda, “argumenta”. Quem escreve parece ter perdido um pouco deste direito primitivo; mas Quarteto fantástico e o surfista prateado merece que a gente perca a civilização na polidez de um texto: é um dos abacaxis do ano, fala bobagem o tempo inteiro e, pior, envereda com suas bobagens por assuntos tidos por mais sérios, como a radiação que afeta o mundo. O perigo desta radiação é representado pelas sinistras e ocultas intenções do surfista prateado, que, a serviço dum poder distante, deve devorar os planetas, inclusive este habitado por gente comum protegida pelos fantasiosos super-heróis dos quadrinhos, como o elástico senhor fantástico, a mulher invisível, o tocha humana, o horrível coisa. Se os quadrinhos alguma vez serviram ao cinema (e cineastas de prestígio como o francês Alain Resnais foram aplicados estudiosos desta linguagem quadro-a-quadro), não será neste Quarteto fantástico que o espectador poderá enxergar alguma relação importante; um destes autênticos desperdícios de celulóide, como escrevia o crítico gaúcho Tuio Becker em seus textos dos anos 70 e 80.

Por Eron Fagundes

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