12
de abril de 2006
A ciência quântica é o charme do mundo intelectual de hoje; valendo-se deste atrativo, a realização norte-americana Quem somos nós? (What the bleep do we know?; 2004), rodada a seis mãos por William Arntz, Betsy Chasse e Mark Vicente, enfileira uma série de questões complexas (cujo centro é uma indagação em torno da natureza de nosso ser) que aparecem na tela sob uma forma de bombardeio audiovisual que não chega a ser bem digerido pelo espectador. Os excessos de informações científicas são dispersões brilhantes como dizeres mas inevitavelmente superficiais como cinema; à maneira de boa parte das produções contemporâneas mais empenhadas, Quem somos nós? transita nas fronteiras entre o documentário e a ficção, eliminando os marcos, embora um certo tom de documentário de idéias (especialistas tergiversam enquanto estereótipos circulam como personagens) prevaleça na narrativa.
Quem somos nós? envereda igualmente por um cientificismo atroz, buscando explicar o comportamento humano por uma exclusiva e incômoda teoria química. Tudo bem: o propósito do filme é adequar uma estrutura dramática do filme ao pensamento quântico. Mas os limites de talento dos realizadores do filme é escasso; basta evocar duas obras-primas que aplicaram a ciência à ação de personagens: Duas ou três coisas que eu sei dela (1967), do francês Jean-Luc Godard, e Meu tio da América (1980), do também francês Alain Resnais. Se Quem somos nós? mantém uma montagem sem nuanças que torna a metralhadora informativa plana demais, em Godard e em Resnais os exercícios lingüísticos vencem logo a barreira inicial da informação para se alçar a uma reflexão estrutural que só grandes cineastas podem obter destas matérias complexas.
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Por
Eron Fagundes