Celebridades
(Celebrity; 1998), o filme de Woody Allen que chegou um pouco atrasado aos cinemas
brasileiros e agora está disponível também em DVD para os adeptos da comodidade
caseira em nova tecnologia, evoca em seu ritmo cinematográfico o estilo de filmar
que celebrizou o italiano Federico Fellini: as seqüências são saltitantes, em
sua busca de dar uma visão abrangente da sociedade nova-iorquina Allen faz sua
câmara saltar inquieta e em certo sentido documentalmente. Mas, conquanto os tipos
em cena pareçam extraídos duma fauna felliniana (mulheres sensuais, homens ridículos),
a marcação cinematográfica de Allen se aproxima em algumas das encenações do francês
Eric Rohmer: tênues movimentos de câmara que, em planos-seqüëncia, captam os intelectualizados
diálogos das personagens.
Embora
faça as citações devidas a seus mestres europeus (nada mais felliniano do que
o humor daquela seqüência da chegada equivocada de obesos para uma tomada cinematográfica
que exigia outra categoria de pessoas: a dos obesos era a do dia seguinte, alguém
da produção se confundiu), o novo Allen é bastante pessoal em sua perversidade
e na desabusada ironia com que tenta demolir o mito da celebridade em nossa sociedade
atual. O repórter vivido por Keneth Branagh, imitando Allen em seu jeito de interpretar
e falar, serve para que o realizador reflexione sobre o poder de criação de celebridades
por parte da mídia no mundo de hoje.
Homem
célebre, Woody Allen coloca-se com seu filme no centro do furacão. A personagem
de Branagh é um romancista que vai tentar a sorte em roteiros de cinema; a rápida
aparição de Leonardo DiCaprio como um jovem ator desgovernado emocionalmente que
quebra o cenário de um quarto de hotel revela a habilidade de Allen em utilizar
o astro de Titanic (alguém lembra que este filme de 1997 foi dirigido por James
Cameron?) como exemplo do uso da celebridade. As crises sentimentais entre homens
e mulheres vão abalar a estrutura íntima das personagens e do filme.
O
vocábulo "socorro" que aparece nos céus de Nova Iorque no início e ao fim da fita
é o rugido do indivíduo contra a massificação contemporânea. As perdições da Nova
Iorque atual no cinema de Allen correspondem às perdições da Roma do começo dos
anos 60 para o cinema de Federico Fellini.
Por Eron Duarte Fagundes