13
de outubro de 2003
Como
ocorria em Embriagado de amor (2002), de Paul Thomas Anderson,
Secretária (Secretary; 2002), de Steven Shainberg, vai
buscar o inusitado de seu universo fílmico numa criatura
cuja vulnerabilidade mental está à flor da pele.
Na verdade, as características patéticas e dementes
da protagonista de Secretária não são somente
dela mas também de seu coadjuvante, a personagem do advogado
com quem a estranha e masoquista secretária vai completar
seu círculo de perversidade.
Shainberg
não deixa de conferir à sua narrativa
brilhos acima da média, graças ao rigor formal
da realização e aos extraordinários desempenhos
de Maggie Gyllenhaal e James Spader. O marotamente provocativo
olhar final da secretária para a câmara (=para os
espectadores), em primeiro plano assombroso, está entre
os grandes achados interpretativos do cinema nos últimos
anos.
O
senão mais grave de Secretária é que,
depois da metade do filme, as situações começam
a incomodar aqui e ali em função da repetitividade
que o cineasta, sem o estofo de gênio do italiano Pier
Paolo Pasolini em Salò, ou os 120 dias de Sodoma (1975),
não logra resolver plenamente. Ainda assim, Secretária é um
espetáculo que merece a visão cuidada do espectador;
os aspectos inusitados de sua história que envolve dependência,
prazer e dor, assim como certas formas de encenação
raras no cinema comercial conduzem o drama surrealista de Shainberg
a uma posição quase única no cinema de hoje.
Por Eron Fagundes
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