HOLLYWOOD NO JAPÃO
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26 de janeiro de 2004

O olho colonizador de Hollywood está em toda a parte. Chega ao Japão medieval do século XIX em O último samurai (The last samurai; 2003), realizado por Edward Zwick. Hollywood sabe atravessar bem as barreiras do espaço e do tempo e topar sentido de aventura à americana nos assuntos que convêm.

O cineasta argentino Fernando Ezequiel Solanas, ao apresentar sua obra A viagem (1992) ao público do projeto Raros da Sala P.F. Gastal de Porto Alegre, definiu sua narrativa como um filme de aventuras recheado de referências à história argentina e latino-americana. Que significa a expressão filme de aventuras? Será que qualquer filme é sempre uma aventura? O sentido de aventuras de A viagem (Solanas foi roteirista de quadrinhos e presta homenagem ao incluir em sua montagem imagens de quadrinhos) dista anos-luz do que é a aventura em O último samurai; por aí se vê que usar a mesma expressão para definir coisas tão diferentes só pode gerar equívocos.

A realização de Zwicxk é uma aventura fantasista e escapista que, embora ambientada num tempo histórico, dissolve qualquer compromisso de comparação com a realidade. Hollywood usa aparentemente aqueles mesmos elementos de que um Akira Kurosawa extraía profundas indagações, todavia para produzir um espetáculo determinado pelos gostos de massa. O intragável estrelismo de Tom Cruise é um evento de ridículos no seio daqueles atores japoneses que se esforçam por impor uma certa seriedade-samurai ao tema que, para o olhar colonizador de Hollywood, é só um meio para chegar a uma aventurinha cinematográfica capaz de agradar ao público.

Nada contra, antes que alguém saque contra mim alguma escopeta ou flecha envenenada de samurai. Mas é bom colocar O último samurai em seu devido lugar: o cinema como passatempo fútil e caça-níqueis, que eu também sei curtir sem levar muito a sério.

Por Eron Fagundes