23
de abril de 2007
O
inglês Ken Loach é um dos grandes nomes
do cinema atual e seus poderosos dramas políticos,
que ainda tem a capacidade de se comunicar com uma
platéia educada por um universo visual diverso
daquele em que o cineasta concebeu sua estética
do engajamento, emocionam por via de regra. Ventos
da liberdade (The wind that shakes the barley; 2006) é uma
nova amostra de seu talento narrativo e de pensador
lúcido do mundo contemporâneo.
Como
Terra e liberdade (1995), talvez o ponto alto do
cinema de Loach, em Ventos da liberdade há uma
virulência que chega ao panfletário
na exposição das intolerâncias
radicais da conduta humana. Como a luta fratricida
da guerra civil espanhola de Terra e liberdade, as
escaramuças bélicas eternas entre irlandeses
e ingleses na Irlanda dos anos 20 do século
XX, em Ventos da liberdade, é um retrato contundente
da estupidez do homem em todas as latitudes. E ninguém
melhor do que Loach sabe transformar em imagens estes
perigosos e dolorosos assuntos.
As
características britânicas da linguagem
cinematográfica de Loach, assim como ocorria
com Stephen Frears em A rainha (2006), outro dos
destaques do ano, se recortam especialmente na precisão
dos detalhes de cores e luzes, presente em realizadores
tão diferentes quanto Alfred Hitchcock e Joseph
Losey. São todos, estes ingleses, preciosistas
da forma, mas nunca formalistas estéreis.
Loach,
todavia, vai muito além das formas
cinematográficas ao mergulhar nas complexas
mutações das personagens. O irmão
mais desligado e conformista, Damien, se converte
num radical movido pela indignação
diante da violência injusta do inimigo. Aquele
que era mais intransigente, Teddy, vira conciliador,
tenta o desarmamento no final e vai determinar a
execução de seu próprio mano
Damien porque este não quis dizer onde estão
as armas do grupo. Neste confronto meio sarcástico
e cruel entre irmãos para coroar o sentido
perverso de Ventos da liberdade, Loach localiza o
fundo do poço da natureza humana, a quanto
precisamos descer para atingir a liberdade de movimentos
e pensamentos; a execução de Damien
por Teddy é reflexo duma execução
anterior em que Damien determinou a execução
dum garoto com quem conviveu desde a infância;
assim como a mãe do garoto morto pragueja
dizendo que nunca mais quer ver Damien, para quem
ela preparava café quando pequeno, a namorada
de Damien se atira contra Teddy, ao sabê-lo
assassino do irmão, dizendo que desapareça
da frente dela para sempre.
Pois
aí está Ventos da liberdade, um
filme que repõe o gosto pelo melhor cinema.
Por
Eron Fagundes