08
de março de 2004
Desde
O expresso da meia-noite (1978), o realizador inglês, radicado
em Hollywood, Alan Parker tem revelado uma fraqueza por golpes
narrativos plásticos capazes de aliciar o espectador mais
despreparado. Cheio de pretensas intenções críticas
sobre o tema de que se aproxima superficialmente e valendo-se
dos conhecidos fricotes visuais britânicos, Parker tem-se
dado bem no cinema americano graças às facilidades
de comunicação com o público.
Seu
novo filme, A vida David Gale (The life of David Gale; 2003),
parte de um assunto espinhoso: a questão da pena de morte
nos Estados Unidos. Colocando em cena um professor de filosofia,
vivido com despojado interesse por Kevin Spacey, Parker inicialmente
discute antropologicamente o problema da usurpação
pelo Estado do direito de matar, revocando Sócrates e
Platão; para a ligeireza do cinema de Parker, as referências
são muito pretensiosas e deslocadas.
Depois
de seu começo intelectualizado, a narrativa resvala
nos lugares-comuns. O que seria um questionamento metafísico
da pena de morte se transforma num caso de escândalo individual:
um professor de filosofia é acusado de estuprar uma de
suas alunas. A trajetória da personagem é contada
em flash back numa versão que ela mesma dá ao depor
diante duma jornalista que se interessa por seu caso, um curioso
desempenho da atriz Kate Winslet; o que, nas mãos dum
Orson Welles, se verteria num semidocumentário, por Parker
vai de equívoco em equívoco ficcional.
A
pretendida trama sinuosa e nebulosa se converte em confusão
de roteiro. Parker continua o mesmo: não aproveita a excentricidade
de suas idéias para uma análise aguda da sociedade
americana; prefere mergulhar no artificialismo formal de que
a platéia gosta.
Por Eron Fagundes
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