TECNICISMO DE REZENDE A SERVIÇO DE UM TEMA CORTANTE
 

 

10 de agosto de 2006

Em Zuzu Angel (2006) o cineasta brasileiro Sérgio Rezende roda talvez seu filme mais eficaz e forte; Rezende é um realizador que por via de regra utiliza de maneira contundente os recursos de produção numa montagem meio alucinada e facilmente emocional para chegar aos olhos do espectador e driblar seu coração, iludindo-o. É mais ou menos o que ele torna a fazer em Zuzu Angel, valendo-se dos significados heróicos que possa ter a batalha duma mulher de garra contra a cinismo, a hipocrisia e os desmandos do regime de força que se instalou no Brasil entre 1964 e 1984.

Nada de novo em Zuzu Angel, nada que não se tenha visto muito no cinema e fora dele; mas mesmo assim, graças à precisão dos vocábulos cinematográficos de Rezende, algo a que se assiste com o coração na mão. Dito isto, é curioso observar como a era de violência institucionalizada dos anos 70 parece hoje pré-histórica, éramos perseguidos e morríamos então por divergências ideológicas ou questões de corporações; nos dias de hoje, a insegurança vivida por Zuzu Angel em face do evento de seu filho é de todos os brasileiros, independentemente de suas posições ideológicas, os bandidos de hoje não têm ideologia, vivemos na mais absoluta selva. É bem verdade que o agora é conseqüência do ontem, há um desenvolvimento histórico em progresso; mas o ontem descrito por Rezende em seu filme parece desligado do agora, parece de pré-história. Estes anos pós-modernos são intensamente individualistas: ninguém quer mudar o mundo; o que se quer, como Zuzu antes de as garras dos militares se abaterem sobre seu filho, é buscar a melhor veste para nosso corpo.

Não creio que a bonita Patrícia Pillar tenha sido a melhor escolha para caracterizar Zuzu na tela; mas Daniel de Oliveira está muito ruim como o militante de esquerda Stuart e Luana Piovani (ainda bem que aparece pouco) está longe da loucura de formas de Elke Maravilha, que era um deslumbramento como persona na televisão brasileira da década de 70. No mais, o elenco de apoio é superior ao principal, aparecendo Othon Bastos, Antonio Pitanga e Paulo Betti em algumas pontas curiosas.

Dependendo do grau de afinidade do observador de hoje com seu tema, Zuzu Angel poderá interessar. Nada, porém, que o eleve à condição de visão definitiva duma fundamental quadra histórica da vida brasileira.

Por Eron Fagundes

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