UM DIA MUITO ESPECIAL (Una Giornatta Particolare)

 

Com Sophia Loren, Marcello Mastroianni, John Vernon, Alessandra Mussolini, Antonio Garibaldi, Vittorio Guerrieri, Maurizio Di Paolantonio

 

Diretor

Duração

Produção

Ettore Scola

110 minutos

1977, Itália/Canadá

Gênero(s)

Distribuidora

Data de Lançamento

Drama

Versátil

10/12/2004

SOM & IMAGEM
FILME
EXTRAS & MENUS
GERAL
Áudio
Legendas
Vídeo
Região

Italiano (DD 5.1)
Português

Sinopse

"Um Dia Muito Especial é uma das obras-primas do grande Ettore Scola (O Baile) e talvez o melhor trabalho da dupla Marcello Mastroianni e Sophia Loren. Nesta Ed. Especial, o filme é apresentado em versão restaurada e remasterizada no formato widescreen anamórfico, com mais de uma hora de extras. Roma, 6 de maio de 1938. Enquanto a cidade celebra a visita de Hitler a Mussolini, dois vizinhos bastante diferentes se conhecem: a dona de casa Antonietta, casada com um militante fascista e mãe de seis filhos, e o radialista homossexual Gabriele. Ao longo do dia, vivem uma densa relação humana, compartilhando seus dramas e esperanças. "

Comentários

São poucos os prejuízos que a passagem dos anos trouxe a uma revisão de Um dia muito especial (Uma giornatta particolare; 1977), o mais belo filme assinado pelo italiano Ettore Scola. Estes prejuízos se concentram na maneira meio suja com que a restauração atual (NE: nos cinemas, em 2003) recriou o estudado tom desbotado da fotografia de Pasqualino de Santis (neste sentido, mesmo considerando-se as diminutas dimensões da tela, uma restauração em dvd como aquela de Laranja mecânica, 1971, de Stanley Kubrick, é bastante mais fiel visualmente); para o espectador que, no fim dos anos 70, desfrutou da sofisticação pastel das imagens da realização, resta apelar para a memória.

Quanto aos demais aspectos, o trabalho de Scola permanece irretocável em sua capacidade de arrepiar de emoção o observador de hoje. O realizador começa sua narrativa com aquela câmara flutuante que se movimenta, com intimidade, pelas peças do apartamento para ver como a dona-de-casa acordará o marido e os seis filhos para o desfile daquele dia histórico em que Hitler visitará Mussolini em Roma; discípulo do italiano Michelangelo Antonioni, Scola recusa o plano-seqüência angustiado e metafísico de Antonioni: o plano-seqüência em que Antonieta vai despertando sua família, revelador de um extraordinário senso de espaço cinematográfico um tanto quanto ausente de boa parte da produção contemporânea, é outro tipo de plano-seqüência, íntimo e familiar. A forma meio descontraída, descritiva, aberta do início do filme vai alterar-se: à medida que a história avança, e as intenções de confronto dos protagonistas da narrativa para questionar o grande dia se esclarecem, os planos gerais (que resgatam o cenário fascista das grandes arquiteturas) se alternam com os primeiros planos fixos (que colocam em cena duas das mais notáveis interpretações do cinema em todos os anos, uma Sophia Loren dona-de-casa composta com as cores do neo-realismo que deveria inspirar a falsificação de Julia Roberts, um Marcello Mastroianni cheio de uma melancólica beleza de expressões) para produzir a sintaxe específica do filme, feita com simplicidade mas também com personalidade própria.

Um dia muito especial tem o tempo exato de cada ação, onde cada gesto adquire uma insubstituível função narrativa. Ao utilizar o cinejornal como intróito à ficção que se propunha contar, Scola busca para seu filme uma aproximação com o documentário, uma antecipação do melodocudrama que se disseminaria ao longo dos anos 80. Quando o preto-e-branco do cinejornal é cortado para a grande bandeira fascista desfraldada duma janela, os olhos não sofrem este corte: a imagem anterior é continuada na posterior, pois as cores pastéis se revelam um minúsculo estágio adiante do preto-e-branco. A voz que narra o cinejornal é a mesma voz radiofônica que vai tornar-se o acompanhamento sonoro de fundo (ora mais alto, ora mais baixo) do dia especial de Antonieta e Gabriel, a mulher oprimida e o homossexual perseguido pelo regime; Scola foi bastante feliz ao escolher as duas principais vítimas do fascismo, a mãe de família e o invertido sexualmente, para viver esta história de amor silenciosamente contestatória. Se a fotografia do cinejornal se prolonga na do filme, se os sons do cinejornal são revividos pela transmissão radiofônica que ecoa pelos espaços abertos e vazios do prédio por onde Gabriel e Antonieta vão exercitar sua conscientização e desalienação, o dia especial de Hitler e Mussolini vai ter seu antídoto no dia especial dos protagonistas do filme de Scola.

Passados vinte e cinco anos de seu lançamento nos cinemas brasileiros, Um dia muito especial revela a eternidade de certos filmes que, para além dos modismos de sua época, têm a capacidade de aprofundar-se no interior de suas personagens. E, ao efetuarmos a comparação com obras recentes do realizador (O jantar, 1998, ou Concorrência desleal, 2001), podemos verificar como aquele antigo frescor clássico de filmar se perdeu num academicismo rançoso.

A objetividade ou transparência dos símbolos narrativos em Um dia muito especial pode ser avaliada nas imagens finais em que Antonieta, antes de ir para a cama de seu marido, apaga as luzes da casa, escurecendo o ambiente: ao mergulhar estas cenas finais em sombras, Scola está identificando as sombras com o fascismo. Nesta translucidez de significados Scola difere de seus mestres italianos Luchino Visconti e Federico Fellini, mais barrocos e enviesados em seus signos.

Como curiosidade final deste comentário, quero evocar a encenação teatral que José Possi Neto extraiu do roteiro do filme de Scola nos anos 80, com as interpretações de Glória Menezes e Carlos Zara, e que teve apresentações em Porto Alegre em 1986. Tratava-se duma versão teatral bastante detalhista em sua fidelidade ao filme, inclusive naquela imagem hoje clássica em que Sophia Loren (Glória Menezes) acaricia o órgão sexual enrijecido de Marcello Mastroianni (Carlos Zara). (Eron Fagundes, publicado na coluna Cinemania em 2003)

Extras

- Entrevistas: são seis, sem data ou identificação de origem, ou seja, sem sabermos se fazem parte de algum documentário ou se foram realizadas especialmente para o DVD. Mas, de qualquer forma, todas são muito interessantes:

- Ettore Scola, Diretor: várias curiosidades, como a de que Pasolini faria um prefácio no seu filme anterior, Feios Sujos e Malvados, o motivo de ambientá-lo nos anos 30 por causa da importância do momento histórico da época, - com diversas cenas históricas de arquivo -, o significado de ser “o filho da Loba”, a manipulação publicitária da época, e muitas importantes informações sobre o roteiro, personagens e a realização do filme. Com 17 minutos.

- Maurizio Constanzo, Roteirista: comenta que o seu envolvimento com o roteiro causou muitas lembranças do seu passado quando criança e, com estas memórias, nos dá maiores detalhes sobre localização política do filme na História. 6 minutos.

- Armando Trovajoli, Compositor: como foi difícil fazer as músicas do filme e sua integração com Scola. 9 minutos.

- Luciano Ricceri, Diretor de Arte: conta todo processo de como foi fazer toda a criação dos aspectos cênicos, o uso as cores, entre outros comentários. 8 minutos.

- Vittorio Vidotto, Historiador: interessante abordagem sobre o filme em um paralelo com a História. 11 minutos.

- Renato Nicolini, Arquiteto: nos dá maiores informações históricas sobre a arquitetura da época em que se passa o filme. Neste caso, seria interessante a inclusão de imagens complementares. 10 minutos.

- Trailer de Cinema

- A Restauração: clipe de 4 minutos mostrando imagens do filme sem restauração ao lado da restaurada, muito mais bem definida e, principalmente, “desbotando” as cores conforme o original.

- Vida e Obra de Ettore Scola: bom texto sobre o Diretor, com sua filmografia selecionada, num total de 14 telas.

- Biografias: de Mastroianni e Sophia, idem ao anterior.

- Ficha Técnica do DVD

Críticas ao DVD

Um grande filme com um DVD a sua altura. A imagem restaurada nos leva a concepção do cineasta, imagens pálidas, quase que neutras. Praticamente sem imperfeições na passagem para o formato digital, ainda nos brinda com o formato original de cinema (e há uma boa surpresa: se seu player estiver configurado para PAN & SCAN e você preferir este formato standard, você verá o filme em "tela cheia", por mais que se perca as imagens nas laterais. Gosto não se discute.) e áudio em 2 (não citados na embalagem, mono) e 5.1 canais (embora neste caso as caixas traseiras sejam muito pouco utilizadas e a central, bastante). Os extras (todos legendados) valem a pena, apesar de parecerem poucos. As entrevistas são esclarecedoras, importantes tanto pelo aspecto cinematográfico como pelo histórico. Um DVD que tem que estar na coleção de quem é fã do bom cinema italiano e, principalmente, de Scolla, Mastrioanni e Sophia Loren.

Menus
Resenha publicada em 16/03/2005
Por Eron Fagundes (filme) e Edinho Pasquale

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