"Um dos filmes essenciais dos anos 60, O
Eclipse é a última
parte da célebre "trilogia da incomunicabilidade" do
mestre Antonioni (A Noite). Esta obra-prima é apresentada
em versão restaurada no formato widescreen
anamórfico, e traz vários extras, incluindo
entrevistas e especiais. Logo após terminar
com o namorado, Vittoria (Monica Vitti) conhece Piero
(Alain Delon), um jovem operador da bolsa de valores.
Apaixonados, iniciam um conturbado romance pelas
ruas de Roma.
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O eclipse (L’eclisse; 1961) coroa a trilogia
fundamental do cineasta italiano Michelangelo Antonioni.
Completando aquilo que ele começara a dizer
em A aventura (1959) e seguira implacável
por A noite (1960), o realizador altera a percepção
cinematográfica da crise do homem do século
XX diante dos impasses mal definidos dos relacionamentos
pessoais. A questão homem-e-mulher em Antonioni
adquiriu nos três filmes uma estatura diferente,
um modelo que, apesar de ele antes já ter
aprofundado seus temas em obras-primas como As
amigas (1955) e O grito (1957), era desconhecido e secreto.
No início de O eclipse planos e diálogos
ríspidos e exasperantes revelam a insatisfação
da protagonista ao contato com os rumos de sua relação
com o amante; as preocupações, avanços
e recuos das cenas iniciais entre Vitória
e Ricardo não são tematicamente novas,
novo é o olhar enviesado e marcadamente geométrico
de Antonioni para o gesto humano circundado por um
cenário característico. Antonioni é formalista;
mas seu formalismo nunca é vazio: a profundidade
está colada na forma. Em seus filmes da trilogia
do vazio Antonioni depura o cinema que outro italiano,
Roberto Rossellini, já apresentava a platéias
perplexas e despreparadas no começo da década
de 50 em Europa 51 (1952) e Viagem à Itália (1953).
Quem
se dispuser a exercitar o olhar por seqüências
ora de um, ora de outro filme da trilogia, parece
que está assistindo a peças de uma
mesma narrativa. A coerência destes filmes é seu
coração estético. Em O
eclipse a câmara persegue o caminhar e o rosto de Monica
Vitti, mulher do cineasta; se você olhar em
seguida um plano de Jeanne Moreau caminhando em A
noite, terá a impressão de que são
partes da mesma caminhada. Em O eclipse um ventilador
gira mexendo as páginas de um livro; os planos
de natureza do começo de A aventura poderiam
imiscuir-se dialeticamente nas observações
densamente urbanas de O eclipse. É
impressionante a plasticidade lenta e elaborada de
O eclipse, talvez o mais abstrato dos filmes da trilogia;
quando o espectador se dá conta, já se
foi uma hora de filme sem nada, o tédio mesmo
em cena, a balbúrdia nas cenas da Bolsa de
Valores, as estéreis indecisões sentimentais
de Vitória, a figura plana e árida
de Piero (um jovem e escultural Alain Delon). A magia
de Antonioni vem do conceito de expor impiedosamente,
numa forma tão revolucionária quanto
adequada, a falta de perspectivas da burguesia européia
de então.
O
senso do cenário é um dado de que
Antonioni nunca abdica; o cenário em Antonioni é uma
personagem da linguagem. O símbolo está ali
e parece bastar-se por si mesmo. É pelo raciocínio
do cenário que se explica a conclusão
narrativa de O eclipse, talvez a mais engenhosa conclusão
cinematográfica de uma obra de Antonioni,
sempre maravilhoso nos finais de seus filmes. Senão
vejamos. Depois do aparente ajuste de Piero e Virótia,
Antonioni dispõe planos diversos que buscam
significar a estética urbana da década
de 60. Um plano fixo de um objeto, outro plano fixo
e outro objeto, e assim por diante, algumas breves
panorâmicas, um pequeno e curvo plano aéreo,
tudo articulado para gerar o último plano
do filme, a intensa luminosidade do eclipse que cega
o espectador e liquida com a visibilidade do filme.
De certa maneira, a insistência de planos da
seqüência final vai pouco a pouco abstraindo
o conteúdo dos planos para se converter numa
forma pura, que é a raiz da novidade reflexiva
de Antonioni.
Há um
paradoxo em O
eclipse, cujo véu
se torna obscuro de desvendar (as coisas nunca são
simples com Antonioni): quanto mais se enraíza
num cinema literário e existencial, mais a
forma de Antonioni documenta o mundo. É mais
ou menos este paradoxo ontológico que torna
o fim de O eclipse tão inquietante:
vemos as imagens do olhar interior de Antonioni ao
mesmo
tempo em que estão ali significativas documentações
da civilização moderna. (Eron Fagundes)
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- Trilogia da Incomunicabilidade: trecho de um ótimo
documentário disponível na sua totalidade
em outro DVD do diretor, A Noite. Por que não
ao menos repetir por inteiro aqui?
-
Vida e Obra de Antonioni: boa biografia em telas
com textos sobre o Diretor e sua filmografia.
-
Uma Palavra do Diretor: duas telas com um texto de
Antonioni dando um interessante depoimento sobre
o flme.
-
Biografias: dos atores Alain
Delon e Mônica
Vitti, em textos interessantes e suas filmografias
selecionadas.
-
O Eclipse em Cannes: 4 telas,
a primeira com um cartaz quando da exibição
do filme na Festival, seguido de mais 3 com textos
sobre a
repercussão dói filme.
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Mais um clássico do históico cineasta
italiano com uma edição bastante digna
e importante. Tecnicamente na média da distribuidora,
bem superior até com relação
a filmes mais recentes. Menus estáticos, mas
condizentes com o filme, extras na sua maioria com
bons textos na ausência de mais materiais disponíveis
de época. Mais um DVD para os cinéfilos
e estudantes de cinema, além de quem tem a
curiosidade de aprender um poucoi mais sobre a história
do cinema europeu.
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