Os
aparatos tecnológicos sempre estiveram a serviço
do cinema americano. Ninguém como eles sabe
servir-se dos avanços da tecnologia visual
para construir uma visão formalista do mundo.
Um cineasta americano típico deve saber hipnotizar-nos
com os encantos da imposição visual;
algo que nos faça esquecer o roteiro furado
e artificial e a superficialidade de caracteres e
idéias.
Aí está The Matrix Reloaded (2003),
dirigido pelos irmãos Larry e Andy Wachowski. É bastante
superior ao primeiro episódio da trilogia:
desenvolveu uma tecnologia visual mais arrebatadora –as
maiores trivialidades, como correria de carros e
motos e destruição de cenários,
adquirem os contornos dum balé cibernético-cinematográfico
que não deixa indiferente até aquele
espectador que se recusa a mergulhar na mistificação
do filme. É esta tecnologia sofisticada que
acaba por soterrar em alguns momentos as fragilidades
da história ridícula e pretensiosa;
o filme convida a esquecer todos os seus problemas
para deitarmos ao som e à imagem de sua hipnose
técnica; aí variará de espectador
para espectador aceitar a precária experiência
proposta pela realização.
Na
era da informática, os irmãos Wachowski
injetaram em seu tema a possibilidade de se criarem
realidades simuladas por computador (a dita Matrix
gerenciaria este controle) em que as máquinas
dominariam os seres humanos. (Um dos problemas é que
os três filmes são incompletos, deveriam
ser vistos como um só, se não fossem
os interesses comerciais dos produtores; quando chegar
a terceira parte, espera-se que alguém se
abalance a unir as três partes em seu todo,
pois é o que na verdade o filme é,
um só.).
Formalmente,
o filme se vale das conquistas digitais para impor-se
visualmente: a multiplicação
do indivíduo do vilão batido pelo mocinho
restaura o velho faroeste no centro da atual cibernética
hollywoodiana. Matrix talvez quisesse decretar o
fim do humanismo cinematográfico: a era do
tecnicismo inconseqüente. Nosso olhar se perde
em visões da mais pura irrealidade. Se Simone
(2002), de Andrew Niccol, tem os pés no chão
para enxergar a fantasia digital, Matrix alça
vôo livre, como uma criança: que é bem
assim, uma criança, que Hollywood quer seus
espectadores.
Tudo
aquilo que é dado como função
de uma técnica exuberante de filmagem em filmes
como 2001, uma odisséia no espaço (1968),
de Stanley Kubrick, ou Apocalypse now (1979), de
Francis Ford Coppola perde o sentido diante das facilidades
de The Matrix Reloaded; a exasperação
do formalismo de Kubrick e de Coppola, cujos exageros
permitiram em sua época uma discussão
nas fronteiras do revolucionário e do vazio
(a passagem dos anos caracterizou indelevelmente
os aspectos revolucionários destas produções),
se concentram em Matrix num único tópico –o
vazio formal alia-se com o vazio temático.
Em
2001 não é a história de
Arthur Clarke o principal trunfo, mas o gênio
de filmar de Kubrick; pergunta-se: que seqüência
de Matrix (seja o I, seja o II) poderia mergulhar
o assistente num êxtase hipnótico como
aqueles travellings no espaço (ou os corredores
de luzes e desempenhos fotográficos –coisas
para cinéfilos empedernidos que os observadores
ainda travados por sua formação literária
terão dificuldades de perceber) criados por
Kubrick? Quando ouço as pessoas de hoje dizerem
que Matrix é um filme de culto e que há um “aprofundamento
das questões filosóficas” no
segundo episódio, cuido que cada geração
deve ter os filmes de culto e a filosofia que merece.
No
meu tempo (é verdade, jovens “matriqueiros”,
estou ficando velho) os nossos filmes de culto eram
obras como Cidadão Kane (1941), de Orson Welles,
e Terra de ninguém (1974), de Terence Mallick;
e não nos referíamos a questões
filosóficas profundas para definir os espetáculos
de Hollywood, mesmo aqueles de que gostávamos,
estávamos cientes de sua posição
de entretenimento. (por Eron Fagundes)
Fui
hoje à cabine de imprensa do tão esperado
Matrix Reloaded aqui em São Paulo (estamos
no dia 15 de maio de 2003). Confesso que somente
passadas várias horas é que consegui "digerir" o
filme. O filme tem seus méritos, no geral
será um grande sucesso mas... Não sei
se devido a todo aparato de segurança, onde
pela primeira vez fui revistado em uma sessão
de cinema até para ir ao banheiro para ver
se eu não portava câmeras ou algo do
gênero, confesso que já não gostei
do evento logo de cara. Pode até ser que um
dia eu mude de opinião, revendo muitas e muitas
vezes o filme e o futuro DVD. Mas não posso
deixar de ser sincero e dizer que esperava MUITO,
mas MUITO mais do filme. Ele tem realmente cenas
maravilhosas, de uma pirotecnia assustadora, onde
os efeitos especiais realmente surpreendem. Mas,
na minha opinião, ficou devendo no roteiro.
Sim, eu sou do tempo onde uma história bem
contada ainda valia mais do que mil efeitos especiais.
Achei os diálogos supérfluos, algumas
cenas sem sentido (mostrarei algumas mais adiante,
com fotos, pasmem, distribuidas pela Warner... não
sei o porquê do aparato todo de segurança...)
e o final decepcionante. Claro que não cometer
a insensatez de contá-lo ou mesmo de revelar
aspectos importantes que estraguem a expectativa
de se assistir ao filme, mas convenhamos que, embora
saibamos que em novembro o filme terá uma
continuação, é frustrante ter
como crédito final a frase "to be continued",
ou seja, continua no próximo filme. e quem
não assistiu ao primeiro (e esse sim revolucionário
em termos de estória) com certeza não
compreenderá nada deste. Daí a minha
queixa.
O
filme começa estraçalhando em termos
de efeitos visuais e ação, começa
com a adrenalina lá no alto. Depois da cena
inicial é que começa o enredo propriamente
dito (se bem que por razões óbvias
não posso contar que é uma das cenas
principais do filme). Depois, o filme consegue surpreender
com as famoas cenas de ação, já presentes
no primeiro filme, mas com certeza mais elaboradas
neste. Mas acho que até demais. Confesso que
o excesso por vezes não me atrai, se torna
banal. Vejam as cenas de luta (depois de várias
cenas "parecidas" em termos de novidade
tecnológica) e me digam se na última
já não deu o que tinha que dar... Claro
que o espírito do filme é esse, até por
personagens que geram esta inquietação,
do repetido, da rotina. Mas achei que exageraram
na dose. E confesso que há uma cena que me
remeteu aos filmes dos anos 50, onde o filme claramente
mostra que a cena de fundo é uma projeção
(montagem), estou me referindo à cena do caminhão.
Claro
que tem cenas maravilhosas, como as de perseguição
de carros e moto, estas sim espetaculares. Mas não
dá pra engolir o personagem principal por
vezes transformado em super-homem, com direito à vôo
e tudo. Os atores estão robotizados, com um
olhar frio, como as máquinas que eles querem
tanto combater. Claro que há mais sensualidade
do que no primeiro, mas até nisso há exageros
para justificar o seu final. Vejam a cena da "dança
coletiva" (repito que não revelarei detalhes
do roteiro) e me digam se ela não está solta,
perdida, apesar de plasticamente exuberante.
Aliás,
isto resume o que pensei do filme. Visualmente até perfeito,
mas com o conteúdo
a desejar. E com muitas referências, repito,
na minha opinião, que não se justificam,
misturando Matrix (o original), com Super-Homem e
até Guerra nas Estrelas ou Aliens. Não
gostei da cena do arquiteto, muito piegas e previsível.
Mas o que interessa? Será um sucesso e pronto.
E com certeza verei a continuação.
Talvez gostando mais deste. Quem sabe. (publicado quando
da exibição do filme para a imprensa, por Edinho
Pasquale)
Revendo
hoje o filme em DVD, talvez tenha exagerado em alguns
dos comentários. OK, é um filme "intermediário" (pois
era pra ser um único, este, Reloaded, e o próximo,
Revolutions), tem seus méritos
técnicos, há incoerências quanto
ao roteiro, mas em DVD
é um bom entretenimento. Perde em algumas cenas
a "magia
da tela grande", mas
compensa na qualidade técnica na "telinha".
Mas
continuo com uma certeza: o primeiro foi infinitamente
superior e, o terceiro, pelo que pude ver nos trailers,
será bem melhor que este. (Edinho Pasquale)
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