29 de março
de 2005
Não
é novidade no cinema o debate sobre certos
pecados da Igreja Católica. Como a sua conduta
repressiva no plano coletivo e também no íntimo
daqueles que professam essa fé. E ainda certas
atitudes contemporizadoras das autoridades eclesiásticas
com o Mal. Os dois problemas aparecem em Um
Crime de Paixão (The Reckoning, 2002),
um filme que merece ser descoberto. Inédito
nos nossos cinemas, está sendo lançado
em DVD pela Paramount e tem a rara proeza de conciliar
suspense com questionamentos de fé.
A trama se passa por volta de 1380 e tem como protagonista
um jovem padre, Nicholas (Paul Bettany) que foge de
sua paróquia quando é flagrado por um
marido traído junto da adúltera, em
pleno coito. Omitindo a sua verdadeira condição,
ele se junta a uma turma de atores. O grupo vai parar
em pequena localidade governada pelo duque de Guise
(Vincent Cassel). Lá chegando, deparam com
o julgamento de uma mulher muda. Ela é condenada
a morte sob a acusação de ter roubado
e assassinado um garoto. Mas Nicholas tem dúvidas,
assim como o líder dos artistas (Willem Dafoe).
Eles encenam em praça pública uma peça
que aponta o que de fato aconteceu, algo muito mais
perverso.
Reality show na Idade Média? Talvez. A trama
policial pode não ter muitas surpresas. Mas
o filme envolve do começo ao fim por vários
motivos. Um é a sua encenação.
A Inglaterra da Idade Média, sob a ameaça
da lepra, ressurge em belas e densas imagens, não
obstante o diretor Paul McGuigan se deixar levar por
certo virtuosismo na meia hora final.
O outro motivo é o excelente roteiro que Marc
Mills fez tendo por base um livro de Barry Unsworth.
Além da originalidade na encaminhamento dado
à essa bizarra investigação,
o script tem diálogos de alta intensidade,
em especial nos que questionam o poder de Deus, que
debatem a força do Mal e do Bem. Por outro
lado, o ótimo elenco dá impressionante
verdade aos conflitos. Notadamente Bettany como o
angustiado e sensível padre. Ele confirma o
talento que já havia demonstrado em Mestre
dos Mares e Uma Mente Brilhante.
Um Crime de Paixão é
um filme dinâmico, uma aventura que provoca
a reflexão. Um ótimo lançamento,
não obstante a ausência de extras.
Por
Alfredo Sternheim