26 de abril de 2005
Nada
como o passar dos anos para alterar posições.
Na minha juventude quase adolescente de cineclubista,
quando fui apresentando a Luiz Carlos Prestes (1898-1990)
antes de uma projeção na sala do Museu
de Arte Moderna em São Paulo (na rua 7 de abril),
fiquei perturbado. Afinal, estava conhecendo uma figura
polêmica e pouco vista, não tinha ainda
opinião formada a seu respeito.. Quando contei
em casa o fato, provoquei reações de
espanto e revolta. Meu pai achou que ele ainda estava
na clandestinidade e temeu por mim. Minha mãe
ficou revoltada: afinal, ele era um comunista (e esse
termo na ocasião significava bandido) e ela,
mais que o meu pai, não o perdoava por ele
ter aderido a Getúlio Vargas em 1950. Getúlio,
justamente o homem que enviou aos campos nazistas,
a mulher dele, Olga Benário. Hoje – e
já há algum tempo – o outrora
perseguido chefe do Partido Comunista Brasileiro é
um mito de nossa história.
A
lembrança acima se deve ao fato que Prestes
está presente em dois lançamentos em
DVD. Em um, OLGA, a sua presença é secundária.
No drama dirigido por Jayme Monjardin adaptado do
livro de Fernando Morais e que se constituiu em uma
das maiores bilheterias de 2004, a figura central
é a mulher do falecido líder comunista,
vivida por Camila Morgado. Trata-se de uma encenação
primorosa, mas que tem seus deslizes nos inoportunos
primeiros planos impostos pela direção,
no excessivo tom severo de Camila e no mal uso da
música. Acrescenta-se a isso, a ausência
no final de uma informação significativa:
o apoio que Prestes deu à Getúlio Vargas
nas eleições para presidente da República
de 1950. Simpatizante do nazismo, o ditador (bem interpretado
por Osmar Prado) foi o algoz da judia Olga, deportada
grávida para a Alemanha. Mesmo assim, em um
gesto até hoje incompreensível, houve
esse apoio de seu viúvo.
Já no outro lançamento, O VELHO, Prestes
ressurge por inteiro. Trata-se de um brilhante documentário
produzido em 1997 e que tem fartas cenas com o próprio
e também com os seus familiares e com pessoas
que, com ele, conviveram. Pode-se discordar do tom
de alguns enfoques, mas o resultado final permite
conhecer muito bem a história daquele brasileiro
contestador e que ficou conhecido também como
o Cavaleiro da Esperança. Mas ele não
esclarece a contento o apoio à Getúlio.
Apenas diz, segundo Fernando Moraes, que tal aconteceu
porque “sua tragédia pessoal não
poderia se sobrepor as razões do País.”
Estranho...
O
documentário de Toni Venturi ressurge no DVD
da Versátil com muitos extras. Alguns trazem
cenas que não estão na edição
final, talvez por questão de metragem. Justamente
uma dessas cenas tem Prestes enfatizando que a culpa
do envio de Olga para os nazistas não foi de
Fellinto Müller, o terrível chefe de policia
daquele governo repressivo e que iria fazer carreira
política até na década de 1970
como senador. Segundo Prestes, Getúlio que
sabia de tudo, poderia ter impedido esse gesto cruel.
A ausência desse curto depoimento é grave,
dá a impressão que o filme quis poupar
Getúlio. Aliás, essa tendência
de aliviar a barra do ditador, de omitir o seu desrespeito
a liberdade de expressão, tem sido freqüente
na mídia.
De qualquer maneira, um pequeno senão que não
prejudica O VELHO no seu todo. O documentário
e mesmo o drama distribuído pela Europa enriquecem
a nossa cultura, o nosso conhecimento sobre o nosso
passado. É auspicioso para quem viveu sob regimes
opressivos, ver que Luiz Carlos Prestes está
ao alcance todos.
Por
Alfredo Sternheim