SPIELBERG INVESTE NO REGISTRO DO HOLOCAUSTO EM ROMPENDO O SILÊNCIO
 

07 de julho de 2005

Cineasta merecidamente admirado por obras primas como ET – O Extraterrestre, Steven Spielberg só ganhou maior respeitabilidade quando fez A Lista de Schindler em 1993, e que lhe valeu um Oscar. Até então era encarado apenas como um notável realizador de filmes escapistas. Mas após essa produção que retrata o verídico episódio sobre o industrial católico que, na época do nazismo, salvou a vida de inúmeros judeus, o diretor passou a ter maior respeitabilidade; afinal ele provou ser alguém preocupado com a História, o Social. Mas Spielberg não se acomodou no sucesso e tomou maior consciência que o sofrimento imposto pela intolerância aos judeus na II Guerra não pode ser esquecido. É preciso registrar tudo o que de fato houve de terrível. Daí ele ter posto seu dinheiro e seu prestígio a serviço de uma fundação, Os Sobreviventes do Shoah, para resgatar e registrar as lembranças dos que viveram e sobreviveram aquele holocausto.

Rompendo o Silêncio (Broken Silence) é uma conseqüência dessa atitude de Spielberg. Nos dois DVDs distribuídos pela Universal, estão cinco documentários com 50 minutos em média, feitos por cinco cineastas de diversos países. Em comum, eles tem pessoas que sentiram na pele a crueldade nazista. No total, são quase cinco horas de filmes e vê-los de uma só vez pode ser enfadonho já que todos têm o mesmo padrão, todas as pessoas aparecem depondo para a câmera.

Mas cada documentário apresenta diversidade nas nacionalidades e em algumas posturas dos depoentes. O primeiro, Alguns que Viveram, dirigido por Luis Puenzo, reuniu sobreviventes do Holocausto que hoje vivem no Uruguai e na Argentina. E dessa maneira fica ressaltada a cumplicidade do governo argentino com os nazistas, o abrigo que lhes deu após a derrota dos alemães. Daí ser chocante ver aquela judia descobrir que, no prédio perto de onde vivia em um balneário no litoral, lá morava o seu algoz na SS. Essa comprovada impunidade ainda espanta.

Dois quatro filmes restantes, o mais inovador nas informações é Crianças do Abismo, do russo Pavel Chukhraj. Mesmo me considerando um conhecedor do que houve no Holocausto (sou filho de um casal de judeus), fiqueis surpreendido com os dados apresentados por esse documentário. Dos cerca de 150 mil judeus que viviam na região de Kiev, apenas 20 sobreviveram. Pavel também foi hábil na inserção de raras imagens daquela época, resgatadas dos porões do governo russo.

Rompendo o Silêncio incomoda, causa desconforto quando, por exemplo uma das protagonistas conta como, de forma involuntária, matou o seu bebê enquanto se escondia dos nazistas. Ou no ódio do homem que padeceu fisicamente em um campo de concentração, mas foi libertado com seqüelas intestinais. Não é nada agradável ver esses depoimentos tristes e, as vezes, raivosos, de gente que realmente sentiu os infortúnios da II Guerra, um conflito que poderia ter sido evitado se o mundo ocidental alheio a loucura de Hitler (leia-se a Igreja Católica, o governo do ditador Getúlio Vargas, entre outros) tivesse sido menos cúmplice, menos tolerante a essa perseguição odiosa. É preciso existir muitos filmes da importância de Rompendo o Silêncio para que isto não se repita. Afinal, o preconceito ainda existe.

Por Alfredo Sternheim