Entrevista com M. Night Shyamalan sobre “Demônio”
 

Como escritor e produtor de Demônio, como chegou à idéia de fazer um filme como este?
Sou um grande fã de Agatha Christie e a idéia de Demônio já estava infiltrando minha mente há cinco anos. Eu também amo filmes que envolvem espaços confinados, onde você aprende sobre os personagens e eles precisam lidar com algo sobrenatural. Isso sempre me intriga. Eu me encontrei pensando muito sobre elevadores e a idéia foi se construindo aos poucos. Eu sabia que queria cinco pessoas com uma delas sendo o Demônio. Foi uma premissa divertida para mim.

Como você é em elevadores – claustrofóbico?
Esse nível de espaço confinado eu aguento, mas eu odiaria ter que rastejar por um túnel. Nesse caso eu não me sairia tão bem.

Você já ficou preso em um elevador?
Sim, várias vezes. Por alguma razão, me encontro sempre em elevadores extintos sem manutenção apropriada (risos). O pior foi quando minha família e eu estávamos retornando de uma coletiva de imprensa ao redor do mundo. Estávamos exaustos após o vôo. Foi uma daquelas viagens péssimas onde perdemos os vôos, bagagens foram extraviadas e estava tudo dando errado. Chegamos ao nosso apartamento, entramos no elevador e ficamos preso. Por sorte meu celular funcionou e o elevador acabou se movendo quando alguém foi acionado.

O que te fez perceber que os irmãos Dowdle, John e Drew, eram a escolha perfeita para dirigir e produzir executivamente sua estória?
Eu tinha ouvido falar de um filme chamado The Poughkeepsie Tapes, mas havia sido alertado de que era muito perturbador. Com essa dica, não o assisti por um tempo. Não queria experimentar no momento a sensação de algo tão inquietante, então eu esperei e esperei. Estava carregando na minha mochila por um tempo até finalmente pensar: “Está bem, vou assistir”. E foi incrivelmente perturbador, muito sombrio, mas muito bom. É tão depravado, mas ótimo e pensei que estes caras realmente dirigiam bem. Eu imaginei se podiam fazer algo divertido (risos). Ouvi falar que estariam com outro filme, Quarentena, que era mais comercial. Tive a sorte de exibir o filme e me diverti muito assistindo. Achei que seriam os caras perfeitos para Demônio. Eu disse: “Esses são os caras. Vamos pegá-los”. Os trouxemos até minha casa e dei a eles o tratamento de Demônio, que eles amaram, e daí em diante foi, “okay, vamos fazer!”.

O quão difícil foi dar um passo para trás e não assumir as rédeas neste filme como diretor?
Para ser totalmente honesto, eu realmente pensei que seria difícil. Todos ao meu redor acharam que eu teria problemas com isso, mas no final das contas não foi assim de forma alguma. Eu estava realmente confiante em John e Drew e acreditei que a história seria a combinação perfeita pra eles. Eu estava ali apenas para dizer: “É assim que eu acho que o filme deveria sentir.” Eu queria me certificar que o nível fosse alto em termos de qualidade, mas basicamente os deixei fazerem o que quer que fosse.  Se algo não soasse legal, eu conversaria com eles, mas no geral eu estava em ótima posição de simplesmente deixá-los fazer seu filme e apoiá-los.

Como produtor, qual é o lema sob o qual trabalha?
Acreditar nas pessoas que contrata e apoiar suas visões. Explicar seu ponto de vista onde você acredita que pode vir a ser valioso, mas apoiá-los acima de qualquer coisa.

Gostaria de fazer mais filmes, onde você é escritor e produtor em contraposição à apenas dirigir?
Gostaria sim. Normalmente ao fim de um filme, você está pesando os prós e os contras do que você criou e do resultado final. Para mim, sempre acaba terminando em categoria bastante positiva, mas não houve nada negativo em trabalhar como um produtor neste filme. Me senti positivo sempre que direcionava minha atenção para ele. Foi empolgante e provocativo para mim. Espero então fazer uma fraternidade de cineastas, onde nos desafiamos. É o que pretendemos fazer por meio de “As Crônicas Noturnas” [projeto no qual Demônio está inserido].

A pressão é menor como produtor comparado a quando você está dirigindo?
Sim, porque nem tudo recai sobre meus ombros. Você consegue aproveitar o processo de filmagem e se divertir mais com ele. Eu com certeza me divirto sendo o “sujeito-faz-tudo”, mas gosto igualmente de ter alguém comandando tudo.

Você acredita no Demônio?
Sim, acredito que exista algum tipo de inferno e esse filme lida com isso em algum nível. Acredito que quando nos sentimos desamparados, é uma sensação de medo e de vulnerabilidade, onde pessoas sentem que não conseguem influenciar no que está ocorrendo ao seu redor. Para sair do que eu chamo de inferno significa assumir a responsabilidade de sua vida. Acredito que se você conduzir sua vida de tal maneira, a onda ruim vai virar e de repente você se encontrará em um lugar muito melhor.

Demônio possui cenas que te fazem pular na cadeira. Porque você acha que nós, como audiência, vê na idéia de espaços confinados algo tão aterrorizante?
Acredito muito em instigar a imaginação da audiência o máximo que você puder. Como cineasta, acho que precisamos instigar o medo e a imaginação da audiência. Digamos que é um monstro  - é muito mais amedrontador ouvir o monstro do que vê-lo. Se você sabe que há algo no armário, você precisa estar pensando: “Não, por favor não abra”. Ou se você escutar arranhões ou respiração, isso dá medo. É ainda mais aterrorizante se você escutar alguém chamando seu nome de lá. O que quero dizer é: deixe no vazio porque é mais amedrontador. É algo com o qual podemos brincar o tempo todo em termos de entretenimento. Temos medo do desconhecido, então eu gosto de manter as coisas mais desconhecidas possíveis e espaços confinados para almejar isso.

Ao início deste filme, ouvimos que essa estória é contada para uma criança para alertá-la de que o Demônio está entre nós. Sua mãe nunca inventou tais estórias de verdade, não é?
Meus pais eram médicos imigrantes que trabalhavam constantemente, então eram ambos clássicos pais extremamente trabalhadores. Quando conto estórias para meus filhos, invento a maioria. Tendem a gostar de estórias que dão medo, então eu sempre digo: “bem, o quão amedrontador você quer essa estória em escala de um à cinco?”. Eles normalmente dizem “cinco”, mas aí eu explico que não poderão dormir depois. “Quatro” significa que conseguirão dormir, mas terão pesadelos, então normalmente nos estabelecemos no “três” (risos).

O quão responsável você foi em reunir o elenco?
John, Drew e eu fizemos os testes como um time, então estive muito envolvido. Sabíamos que queríamos o elenco para trabalhar como um time e ficou claro muito rapidamente quem esse grupo seria. Saímos com nossa oferta para o grupo que mais gostamos e, por sorte, conseguimos todos. Com seleção de elenco, você sempre quer pessoas que trabalham bem juntas, mas é absolutamente crítico quando você tem cinco pessoas que estão em espaço confinado pela maior parte do tempo.

O que espera que a audiência extraia de Demônio?
Quero que seja uma montanha-russa, onde eles sentam em seus assentos e segurem na pessoa ao seu lado, mas também quero que saiam do cinema sentindo um pouco grudentos, como se algo tivesse permanecido com eles. Essa é a meta.

Qual foi a maior lição que aprendeu fazendo este filme com os irmãos Dowdle e como mudou para você?
Eles possuem um senso de “fisicalidade” que eu não possuo. Sou muito mais quieto. Meu ponto mole é a calmaria e há grande valor nisso, sem dúvida, mas eu de fato não sei fazer coisas mais musculares. Eles sabem. Pegaram minha estória e a deixaram maior do que era quando eu pensei sobre. Eles possuem brilho para isso. Eles sabem fazer as coisas físicas e empolgantes e vou levar isso comigo. Acho que você nunca pode parar de corrigir seu gingado enquanto cineasta.

Surpreende que alguém de sua estatura, fazendo os filmes que faz, esteve hesitante na hora de conferir The Poughkeepsie Tapes, por causa do conteúdo sombrio.
Sou muito sentimental. Você sabe, tivemos que nos mudar para nossa nova casa naquele momento e eu não queria sair andando assustado pelos corredores. Queria que fosse um espaço benevolente e The Poughkeepsie Tapes é sobre um serial killer entrando nas casas de pessoas, então você se sente muito vulnerável. Eu estava sendo um bebê sobre isso, não estava? É como se alguém sugerisse brincar com um tabuleiro de Ouija. Eu diria: “Faça na sua casa, não na minha.”

Então o que você assiste quando está em casa e quer se sentir bem?
Como família, assistiríamos alguma reprise de Friends ou algo do tipo. Quando se assiste algo do tipo, você assusta qualquer coisa ruim ou amedrontadora (risos).

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