Os Normais – O Filme

por Felipe Goulart

Nunca soube de alguém que não gostasse de “Os Normais”. Já vi gente indiferente, mas falar mal nunca ouvi. E agora com o fim da série e o anúncio do filme, as pessoas se mostraram ansiosas para conferir o resultado na telona.

É legal esclarecer antes, que a linguagem da TV é diferente da do Cinema. Certas coisas (piadas) que funcionam num episódio de meia hora, não servem num longa-metragem. Tome os Trapalhões por exemplo, que apesar de não ter nada a ver com “Os Normais”, era um programa humorístico (ainda que na forma de “sketchs”), que quando “esticado” em filme, perdia boa parte da sua graça e impacto (e olha que eu amo Trapalhões, mas revendo os programas deles, realmente eram muito mais engraçados que os filmes).

Assim fica mais fácil entender e perceber a mudança de tom dos Normais da TV para o do Cinema (não que uma seja melhor que a outra, é apenas diferente, é outro esquema).

O entrosamento da dupla continua perfeito. O Rui de Luiz Fernando Guimarães continua praticamente o mesmo da série, apenas um pouco mais ingênuo (claro, ele ainda não tinha a experiência de uma Vani azucrinando no seu ouvido por mais de seis anos!); Já Fernanda Torres como Vani parece ser mais “normal” mesmo, mais controlada... (ela ainda não havia encontrado um Rui que a apoiasse em suas maluquices).

Na série era quase impossível descobrir o que era criação da dupla de protagonistas (Fernanda Torres e Luiz Fernando Guimarães) ou da dupla dos criadores/roteiristas (Alexandre Machado e Fernanda Young). Mas aqui existem momentos bem evidentes do que é a cara da Fernanda Young.

Talvez por já conhecer melhor o seu estilo – atualmente fazendo o programa “Saia Justa”, na GNT – que às vezes força a barra insistindo em certas discussões meio inúteis e feministas demais (ela parece querer fixar uma imagem, uma “personagem” dela mesma, com certas posições e opiniões que defende). Digo isso porque na hora que vi a história do OB (absorvente íntimo feminino), era difícil imaginar a Vani ali... aquilo tinha muito cara de Fernanda Young. Mas a essa altura do campeonato... criador e criatura já se misturaram, a Vani acaba sendo uma mistura de 70% de Fernanda Young com 30% de Fernanda Torres.

O seriado (só para constar, foram três temporadas num total de 71 episódios) estabeleceu um novo estilo de narrativa, de pura farsa, meio exagerada mas uma linguagem original (aqui no filme tem uma perseguição com carrinhos de brinquedo, e que funciona, por mais estranho que isso possa soar). Ou seja, uma comédia de situações e de costume (será que dá para comparar com “Seinfeld”, talvez?!). Então, é óbvio que o filme não foge a isso, mas ele está mais para uma Comédia Romântica. Aliás, essa é a grande diferença do seriado, e que talvez possa desagradar a alguns (poucos), é que a fita se torna romântica da metade em diante, o que não acontecia nunca na série. Veja bem, o filme não é ruim e nem acho que as pessoas vão se decepcionar, mas é que sempre quando se tem muita expectativa de uma coisa, geralmente ela acaba ficando aquém do que se imaginava.

Tudo começa já próximo do fim do filme, quando a Vani pede um “mini flash back gigante” para explicar como eles chegaram àquele ponto da história. Legal porque eles já vinham usando esse recurso com freqüência na última temporada, mas acharam um jeito de inovar criando um gigante (mas ainda assim se chama “mini...”!).

Dali volta para os casamentos de Rui e Vani, mas cada um com seu respectivo par. Até então eles não se conheciam. Acontece que as cerimônias ocorrem na mesma igreja, em horários consecutivos. Vani que acabara de se casar com Sérgio (Evandro Mesquita), vai pedir para o noivo do casamento seguinte, justamente o Rui, um pouquinho de arroz, para dar sorte na nova vida de casado. Ele que esperava sua noiva, Marta (Marisa Orth), até concorda em ceder, mas a futura (ex) esposa egoísta não cede nem um punhadinho de arroz. Esse então é o primeiro contato dos dois e daí em diante as situações e encontros vão sucedendo, até obviamente eles terminarem juntos.

Gostei da participação do comediante Tutuca, como pai da Marisa Orth. Em particular na cena que ele joga arroz no noivo (confesso que já fiz coisa semelhante, não num casamento, mas também foi bem divertido! ehehe). Só de olhar para a cara dele eu já acho graça... Durante muitos anos ele fez quadros na “Praça é Nossa” (tinha uma gostosa que ficava dando em cima dele mas ele não se mancava, e terminava sempre com o bordão “Ai se ela me desse bola... !”) e atualmente faz algo semelhante no “Zorra Total”, aos sábados na Globo.

Só teve duas coisinhas que não gostei no filme: 1) terem escolhido Evandro Mesquita para o noivo da Vani, já que ele desde os primeiros episódios do seriado, vinha fazendo algumas participações, e sempre como o mesmo personagem amigo do Rui. A Marisa Orth também já tinha aparecido, mas não com a freqüência de Evandro, que marcou bastante na série. 2) O exagero de duas ou três situações, ainda no começo, que estão completamente fora do tom, como a Vani saindo na porrada com um segurança (a briga posterior dela com a Marisa tem mais sentido, mas a da festa de casamento é forçada e sem graça), e o Rui com comichão nas calças que foram alugadas (a idéia é até legal, mas ficou meio “over”).

De resto tudo é bacana e agrada... não é um filmão excepcional, mas acho também que ninguém vai sair reclamando. Tem momentos muito engraçados, texto inteligente, boas sacadas e por incrível que pareça, é até mesmo romântico!

Vale como dica para quem quiser conferir e matar a saudade, comprar/alugar o primeiro DVD do seriado, que vêm os melhores episódios da primeira temporada. Nem peguem o segundo volume, chamado de “Os Normais – Sem Cortes”, porque é bobagem, são outros episódios (da 2ª temporada), mas idênticas às versões que passaram na tevê – o “sem cortes” se refere aos palavrões que antes apareciam com uma tarja preta na boca dos personagens, acompanhados do famoso e sonoro “piiiiiiiii!”. Não vá achando que têm cenas inéditas nem Vani e Rui pelados porque a decepção será ainda maior!

Mas se eu fosse vocês não compraria nenhum dos dois DVDs, porque eu boto minha mão no fogo se a Globo não vier a lançar em DVD as temporadas completas do seriado. Imagina, é uma baita “mina de ouro” nas mãos deles, ainda mais que as duas últimas temporadas foram gravadas em HDTV (digital de alta definição), o que facilita e melhora a qualidade para o formato. O sucesso da primeira edição do DVD foi tão grande, que em torno de 15 dias e praticamente sem campanha publicitária, ela se esgotou em todo país.

Aliás, eu não duvido nada se daqui a seis meses ou um ano ou dois, eles ressuscitarem o seriado que acabou no auge. É quase igual a Hollywood e suas continuações de filmes “caça-níquel”. Deixa só a Globo estar com o ibope em baixa, precisando reformular sua grade e tal... pra ver se eles não voltam atrás....!


* Felipe Goulart é editor assistente de Rubens Ewald Filho e assina a coluna Trailer aos sábados, no jornal A Tribuna, de Santos, SP.

E-mail : goulart_cinema@yahoo.com.br