21
de janeiro de 2004
Vou
assistir ainda hoje um último musical, mas é pequeno
off-Broadway, chamado The Musical of Musicals. A idéia
parece boa: a mesma história contada de formas diversas,no
estilo de diversos compositores: Rodgers e Hammerstein, Sondheim,
Ebb e Kander, Andrew Lloyd Webber e Jerry Herman. Deve ser divertido.
Comprei os ingressos como presente de aniversário ao amigo
Dwight, que me hospeda. Ele, aliás, foi coreógrafo
e dançarino, e grande amigo e parceiro de Ginger Rogers,
de quem fala com saudades. Também trabalhou com Debbie
Reynolds (me presenteou com alguma memorabilia dela, que uma
vez deu um soco que deixou desacordado um técnico incompetente).
Antes
disso, acabei também vendo outro show, assim mesmo
porque o Dwight me conseguiu um preço mais em conta, 50
dólares o ingresso no domingo a noite. Foi Tabu, de Boy
George, que já tem data marcada para fechar, dia 4 de
fevereiro, porque não pegou mesmo (e sua produtora, a
comediante Rosie O’Donnell vai amargar com o prejuízo
de 10 milhões de dólares, que colocou do próprio
bolso). O espetáculo veio de Londres onde se apresentava
no off-West End.
Foi
ampliado, mas contam que o diretor não teve pulso
forte para controlar Boy (que é o autor da música;
o roteiro foi feito por Charles Busch) que é um péssimo
ator, rebelde, que ainda por cima perdeu a voz (no palco ele
está gordo e careca e lembra um pouco o travesti Divine,
quando se vestia de homem). A história é a sua
própria vida (interpretado por outro) nos tempos em que
freqüentava uma boate chamada Taboo. É um show meio
no estilo de Rent, que tem pretensões a Mama Mia (ou seja,
usa músicas pop famosas como Kharma Camelleon) e espera
que o povo cante junto. Na verdade, devia ter ido para off–Broadway,
onde atrairia uma platéia mais alternativa (o problema é que,
hoje em dia, nada tem dado certo no off-Broadway). Como sempre,
os cantores são ótimos, os figurinos (exóticos)
espetaculares, as canções suportáveis, mas
o entrecho é de uma enorme banalidade (não consegue
ligar a história de Boy George e seu caso gay - todos
os namorados foram sintetizados em apenas um - com a história
de um performer que morre de Aids e que é feito pelo verdadeiro
Boy George). A platéia que eu vi era bem entendida e participante,
mas o show não decolou. A gente chega mesmo a ficar com
uma certa peninha do Velho George ali em cena, super-constrangido
e desastrado.
Master
and Commander - Um dos críticos do New York Times
o colocou em primeiro lugar dentre os melhores do ano, dizendo
que pinta um retrato realista e sincero do que era a antiga Marinha
Inglesa na época do Almirante Nelson. Muito bem, isso é verdade.
Mas não é exatamente o assunto que faz o mundo
tremer de emoção. Realizado pelo australiano Peter
Weir, o filme é longo (principalmente na primeira parte;
parece se arrastar), com um protagonista muito fraco (desta vez,
Russell Crowe não consegue nos fazer gostar ou se interessar
pelo personagem do comandante do navio) e uma trama bastante
banal. Nem chega a ser filme de pirata (e Piratas do Caribe,
mesmo sendo comédia, era muito mais divertido). Mostra
apenas os problemas de um galeão que é atacado
por uma nau francesa mais ligeira (e que deseja os despojos,
a que chamam de Fantasma).
Conseguem
escapar e vão para a costa do Brasil se recompor.
Depois passam por Galápagos (onde o médico de bordo,
feito por Paul Bettany, que também esteve com Crowe em
Uma Mente Brilhante e que tem aqui um bom trabalho, procura catalogar
a fauna local, numa referência clara a Darwin). E se preparam
para enfrentar novamente o inimigo, numa nova batalha final,
bastante bem feita. E o filme é só isso. Não
tem mulher, conflito romântico, aprofundamento psicológico,
histórico, apenas realmente pinta um retrato de época
bastante fiel e acurado (embora eu me lembrasse dos filmes marítimos
de minha infância, que eram super-colorizados e fantasiosos,
e ficasse pensando se eles não eram melhores. Mudou o
cinema ou mudei eu?).
Bad
Santa - Eu detestei essa brincadeira de mau gosto, quase toda
falada
em palavrões (há muitos, mas não nudez,
porque americano é pudico), com o desagradável
Billy Bob Thorton fazendo um ladrão que se disfarça
de Papai Noel para, junto com um anão, assaltar os shopping
centers (e vivem disso durante um ano, para atacarem de novo
no seguinte). Tem tudo de ruim: ele é bêbado,
grosseiro (até xixi nas calças faz), trata mal
as crianças, gosta de transar com mulheres gordas (sexo
anal, informam na fita, de forma igualmente desagradável)
e assim por diante. Nem quero ir muito adiante. O filme tenta
nos convencer que ele se reabilita por atenção
a um menino gordinho, que vive sozinho porque o pai está na
prisão (o menino vive com a avó, Cloris Leachman
em papel patético; aliás o filme tem também
o último papel, muito triste também, de John
Ritter). Tem violência, baixaria, piadas de humor negro
estúpidas e idiotas (atrás de mim uma mulher
ria tanto que até me pediu desculpas, sinal de há gosto
para tudo).
Along
Came Polly - Foi o campeão de bilheteria da semana,
até porque não tinha grandes concorrentes novos.
Também porque junta um dupla popular, Ben Stiller (Quem
vai ficar com Mary) e Jennifer Aniston (de Friends, que aqui
está muito magra, mas é uma comediante sutil e
eficiente). Escrito e dirigido por um dos autores de Meet the
Parents e Zoolander, John Hamburg, o filme tem grande quantidade
de piadas de banheiro e também explícitas. Não
apenas o herói tem dor de barriga, como há barulhos
específicos e de diversas grossuras variadas. Fora isso
(que faz a platéia delirar com as baixarias) o filme é razoavelmente
divertido. Até faz rir. Ben é um técnico
de seguros que se casa (com Debra Messing de Will e Grace) mas,
no primeiro dia da lua-de-mel, ela o trai com um professor de
mergulho (feito por um Hank Azaria super-malhado). Arrasado,
ele volta a Nova York e acaba saindo com uma antiga colega de
ginásio, Polly, que é garçonete (Jennifer).
Uma garota livre e pouco convencional (o filme na verdade erra
em não saber explorar melhor esse personagem, que nunca
chega a ter uma personalidade definida; é uma comedia
romântica em cima de personagem masculina, o que justifica
as apelações). Há também momentos
engraçados, porque o melhor amigo do herói feito
por Philip Seymour Hoffman é um ex-ator juvenil que fez
sucesso com um filme, mas hoje está esquecido e desempregado,
vivendo da glória efêmera do passado. Tem Alec Baldwin
(satirizando a figura do patrão do herói) e Bryan
Brown (como um milionário que deseja ser segurado e vive
se arriscando). Ou seja, é capaz de também fazer
sucesso no Brasil.
Mona
Lisa Smile (O Sorriso da Mona Lisa) - A produtora Revolution,
que distribui pela Sony Columbia, está virando sinônimo
de filme ruim (e de muitas comédias para adolescentes
de péssima qualidade). Como seu chefe Joe Roth (antigo
chefe de produção da Disney) é muito amigo
de Julia Roberts, isso explica porque ela ainda faz filmes para
ele. Mas é bem capaz de mudar, depois desse semi-fracasso
ou decepção, uma espécie de Sociedade
do Poetas Mortos passado numa escola para moças ricas, em
1953 (o ano é mal escolhido porque não é particularmente
um momento de mudanças; dois anos depois já teriam
mais referências, ainda assim já existia Marlon
Brando, Arthur Miller, Tenessee Williams, o que poderia tirar
aquelas garotas do torpor criativo, ou seja, algo já começava
a mudar na sociedade americana, inclusive o rock-n’-roll
estava prestes a ser criado). É difícil dizer o
que rolou errado, porque o filme tinha tudo de interessante,
já que ao lado de Julia, o filme trazia três das
mais talentosas jovens atrizes de Hollywood: Kirsten Durnst,
Maggie Gyllenhall e Julie Stiles (nenhuma delas deixa maior impressão,
porque os personagens são mal construídos e delineados:
o de Kirsten é o melhor, mas acaba virando vilã,
quase caricata). Na verdade, também a figura da professora
de história da arte, idealista, que vai dar aula numa
escola exclusiva (a mais fechada do país) também é mal
caracterizada (por que ela termina com o antigo namorado? Teve
realmente caso com William Holden? Por que aquele romance mal
explicado com o garanhão local, Dominic West, quando nem
serve para ser conflito com a aluna com quem ele transava antes?).
Ou seja, o roteiro é péssimo, o diretor Mike Newell
(que fez coisa boas como Quatro Casamentos e Um Funeral) não
foge da mediocridade e o filme resulta morno. Há absurdos
de vários tipos, desde alunas que na primeira aula já sabem
todo o livro de cor, quanto o fato da enfermeira (Juliet Stevenson)
ter perdido sua companheira lésbica e o fato ser referido
totalmente de passagem, e todo mundo achando normal. Até mesmo
como retrato de época o filme deixa a desejar, enquanto
a relação com o quadro da Mona Lisa é forçada
com o uso da canção e referências a Da Vinci,
mas no fundo tem muito pouco a ver, tanto com Julia (que tem
uma boca enorme, imensa e nada como a do quadro) quanto com o
personagem.
Bom,
a temporada está terminando, assim como os filmes
do Oscar. Dos prováveis indicados não consegui
assistir apenas um, que é Pieces of April (passava apenas
numa única sala, às 22h30 e não dava para
ir por causa do teatro). Vamos ver se não me aprontam
uma falseta, ainda mais neste ano tão confuso, onde tudo
pode acontecer.
Continuamos
conversando na volta. Até lá.
Por Rubens Ewald Filho
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