03
de agosto de
2004
Nada
podia ser mais Nova York do que ontem, quando deram alarme máximo
de perigo de atentado, vai saber porquê.
Fecharam o Túnel Holland e uma das pontes do Lado Leste,
começaram o pânico pela televisão, sem grandes
explicações. Como eu já tinha visto Farenheit
451 e sei que é preciso viver em terror para o Bush ganhar
de novo, não levei tão a sério. Afinal, é perigo
em toda parte, nas Olimpíadas, aqui, na África
do Sul, em São Paulo, terra da Dona Marta. Ou seja, o
mundo está da pá virada e se for para ir, melhor
aqui. Como diz o Armando, assim acabo virando nome de prêmio,
o Rubinho.
Bom, é preciso
se manter o bom humor. Nova York neste agosto está com
calor moderado, suportável. Comecei
vendo de leve dois filmes, antes de mergulhar de cabeça
no que está em cartaz.
After
Sunset
A
Warner criou uma subsidiária de Independentes e fitas
menores (e já passou o trailer da versão americana
do argentino Nove Rainhas, que se chama aqui Criminal).
O trailer é péssimo
(e deu para reconhecer Diego Luna de E sua mãe também).
Espero que o reeditem para o mercado internacional. Enfim, este
After
Sunset é uma produção desta nova marca Warner,
assinada por Richard Linklater, que antes de acertar com A Escola
do Rock, fazia fitas sobre jovens.
Nove
anos atrás ele realizou Antes do Amanhecer/Before
Sunset, uma história de amor em que um americano
Ethan Hawke encontra uma francesa Julie Delpy num trem para Viena.
Eles têm um caso rápido, passeiam pela cidade e
prometem se encontrarem dali a seis meses (não têm
endereço ou nada um do outro). Agora nove anos depois,
finalmente se encontram em Paris, onde ele foi lançar
um livro que contava justamente essa história. E ela reaparece.
Os dois saem andando por Paris (em parques, pela Rive Gauche,
de bateau mouche, o que é sempre um prazer) e vão
conversando, trocando informações (ele foi ao encontro,
ela não pôde porque morreu a avó, ambos ficaram
marcados por isso, mas agora o rapaz está mal-casado e
com filho pequeno). Certamente é o filme americano mais
falado desde Meu Jantar com Andre, de Louis Malle, há quase
trinta anos atrás. Mas o casal colaborou no roteiro e
parece extremamente à vontade, em particular Julie que
nunca esteve melhor no cinema (ela até canta uma música
dela, mesmo porque andou gravando discos como compositora, que
por sinal eu trouxe de Paris há dois anos). Prejudicado
por um final um pouco abrupto, o filme é muito simpático
e muito descartável. Considerando que o primeiro filme
foi pouco visto e pouco lembrado, é um projeto de pura
vaidade. Até bem feitinho (cortado e decupado à moda
antiga, nada de câmera solta, girando em volta deles).
Mas para poucos.
The
Manchurian Candidate
Sempre
acho que é uma má idéia refilmar
clássicos, conforme o próprio diretor Jonathan
Demme pôde atestar com sua recente e horrível refilmagem
de Charada. Mas esta é a exceção
que confirma a regra. Embora não tenha ido tão
bem de bilheteria, esta refilmagem atualizada de Sob
o Domínio do Mal de
John Franenheimer (62) teve excelentes críticas (a sala
que eu vi estava abarrotada e as pessoas reagiram bem, inclusive
vi vários casais discutindo detalhes da trama e alguns
dizendo que era preciso ter visto o filme original para entender
tudo). Co-produzido por Tina Sinatra, filha de Frank que havia
estrelado e produzido o original, o filme é uma decente
e até interessante atualização da trama.
Se alguém nunca viu, é bom explicar que o filme
foi feito antes dos assassinatos de John e Robert Kennedy. E
contava a história de um grupo de soldados na Coréia,
que sofria lavagem cerebral pelos comunistas e voltavam para
apoiar um deles, que se tornaria herói de guerra. Até que
obedecia às ordens de matar o candidato a presidente (para
que o padrasto tomasse o lugar). Quem fazia o sujeito era o inglês
antipático Laurence Harvey, bem de acordo com o personagem.
Agora nesta nova versão, muita coisa mudou.
A
melhor sacada foi transformar o bandido comunista,
que agora não tem
mais sentido, em uma corporação chamada Manchurian
Global que patrocina a lavagem cerebral para assim ter um vice-presidente
a seu serviço (sei que estou revelando um pouco mais do
que deveria, mas não há outra maneira de falar
sobre o filme, prometo me conter. E contar apenas que o grande
vilão da história talvez seja revelado um pouco
cedo demais, mas ainda tem o mesmo impacto, e as pessoas levaram
um susto na projeção, até porque o vilão é realmente
sem escrúpulos, até mesmo incestuoso). Não
gosto tanto da estética da fita, que é feita toda
em closes, por vezes exagerados. Mas Demme (Filadélfia,
Silêncio dos Inocentes) se redime dos últimos
fracassos com uma excelente condução de atores.
Todos estão
excelentes. Denzel Wahsington novamente surpreende (faz bem diferente
de Sinatra e seu personagem é mais louco, mais conflitado
e tem também uma outra função na história)
e está excelente. Igualmente bem está Liev Schreiber,
que andou fazendo muitos filmes antes, mas só agora acerta
(no papel que foi de Harvey, ou seja, o personagem título).
O interesse romântico que antes era de Janet Leigh passou
agora para a negra Kimberly Elise, que tem mais o que fazer e
está melhor aproveitada. Tem ainda Jon Voight (discreto,
para variar), Jeffrey Wright (ponta impressionante) e principalmente
Meryl Streep no personagem que havia sido criado por Angela Lansbury
e que foi certamente o ponto alto da carreira dela. E como seria
de se esperar, ela não decepciona. Como a mãe de
Liev, uma senadora, é outro ponto alto de sua ilustre
e temerária carreira. Portanto, o novo Manchurian é uma
grande surpresa. Não desonra seu antecessor, ao contrário
o atualiza e em algumas coisas até melhora (noutras não). É bem capaz de o filme até se recuperar nas bilheterias
quando o público perceber que The Village é outro
blefe. Mas depois falo dele.
Até a próxima, se
Nova York não se acabar.
Por Rubens Ewald Filho
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