DIÁRIOS DE NOVA YORK - TEMPORADA DE VERÃO 2004 - PARTE II

04 de agosto de 2004

Como dizia o velho samba, anunciaram e garantiram que o mundo, ou ao menos Nova York, iria se acabar…

E tudo continua como dantes, ou seja, é a teoria do pânico mesmo, de que fala Michael Moore.

Enquanto isso, ainda em ritmo lento, de verão, vou vendo alguns filmes interessantes.

Mas não tenho muita esperança de grandes novidades. Hoje, vendo The Village, queimou o filme, literalmente, e passaram vinte minutos decidindo o que fazer. Sem brigas ou reclamações mais fortes.Acabamos passando para outra sala e vendo tudo de novo. Bah… Os americanos não são mais os mesmos…O filme comento depois. Tem estes outros na frente:

Thunderbirds

Anunciado como um dos grandes desastres de crítica da temporada, não chega a ser muito ruim.

É apenas uma fraca imitação de Spy Kids (com toques de Austin Powers e Matt Helm), suportável para crianças. Os fãs da antiga série de TV inglesa com bonecos, Thunderbirds, vão curtir a reprodução da ilha, da cenografia cafona, dos figurinos e dos foguetes. Mas sob a direção de Jonathan Frakes (ator e diretor de Star Trek Next Generation), o filme tem um roteiro fraco e um elenco altamente discutível. A única figura conhecida é Bill Paxton, que faz o chefe da família de heróis, os Tracy, que cometem atos de bravura e resgate como os Thunderbirds. Acontece que ele passa a maior parte do filme desacordado (preso numa base espacial junto com o resto da família, que aparece tão mal e tão rápido que não dá nem para gravar o rosto deles). A história fica toda em cima do filho mais novo, um certo Scott (o loiro, narigudo e antipático Philip Winchester) que tenta salvar tudo com a ajuda de seu amigo (filho de inventor e gago) e a namoradinha indiana (que é sobrinha do grande vilão da história, feito por Ben Kingsley). Comentá-lo mais é bobagem. Não chega a ser horrível, mas francamente não há porque assisti-lo, nem mesmo se for fã do seriado. Imagina fazer um filme de bonecos com atores vivos - poderia resultar num negócio muito engraçado. Só que eles não têm nenhum humor. Anthony Edwards, o astro de ER, faz sem crédito e muito mal, o papel do inventor (pai do menino). Não tem a menor graça, ou chance.

 

The Door in the Floor

Periga ser o melhor filme da temporada e possível candidato ao Oscar (para ator, com Jeff Bridges). Saudado como a melhor adaptação de um romance de John Irving, muito bem roteirizado e dirigido por Tod Williams (Adventures of Sebastian Cole).

É daqueles filmes pequenos e humanos, meio Entre Quatro Paredes. Um adolescente que deseja ser escritor (o ruivinho e bom Jon Foster) vem passar o verão na casa de um escritor de livros infantis (um deles leva o nome do filme, A Porta no Chão, mas há outras explicações para o título também, sem saber que ele está em crise com a esposa (Kim Basinger), principalmente porque há algum tempo eles perderam os filhos gêmeos, já adolescentes, em circunstâncias misteriosas (que só no final comentam). E sobrou uma criança pequena (Elle Fanning, tão talentosa quanto a irmã Dakota Fanning). O garoto acaba se envolvendo com Kim e tendo um caso sexual com ela, sendo que o escritor não se incomoda, em parte porque pensa em se separar, em parte porque está tendo um caso com uma viúva (Mimi Rogers numa aparição muito corajosa, já que aparece nua de forma nada glamourosa, o que sucede também com Jeff. Ambos já passaram da idade de mostrar alguma coisa). Mas o filme é bom, com personagens e situações complexas, que não se resolvem com besteiras. Tudo cheio de nuances (e tampouco abusa da figura do adolescente, o que seria outro clichê; ele não é nem mesmo o narrador da história). Um pouco Verão de 42, só que mais adulto, menos romântico, e portanto mais verdadeiro. Gostei bastante. Kim amadureceu muito bem, se humanizou. Jeff está em um de seus momentos mais discretos e eficientes (ele tem a tendência de, por vezes, carregar demais; aqui está perfeito).

Distribuído pela Focus, é um filme de qualidade e adulto, perdido aqui no verão de blockbusters.

 

Diário de uma Paixão (the Notebook)

Está estreando aí no Brasil nesta sexta-feira pela Playarte, mas só vim assistir aqui, influenciado pelas boas críticas que recebeu. Vendo que o filme era lento e romântico, que a dupla de jovens atores era errada, fiquei com a sensação de que haviam caído na cilada. Tinha defendido o filme porque ele foi dirigido por Nick Cassavetes, filho do grande John Cassavetes, que é o pai do cinema independente americano. Quem se enganou fui eu. Tudo isso é verdade. A direção como narrativa é medíocre e cheia de clichês. E a dupla jovem é toda errada. Ryan Gosling (que fez o judeu nazista de The Believer) tem uma cara alongada de corvo, e não serve como galã.

Rachel McAdams (que foi a Queen de Mean Girls) é uma loirinha com cara de coadjuvante, sem personalidade para muito mais. Por isso fica difícil acreditar na história de amor clichê, passada nos anos quarenta, num verão quando uma moça rica se apaixona pelo rapaz pobre que trabalha como lenhador, ou marceneiro. Claro que a família dela é contra, ainda mais quando aparece um noivo rico e bonito (feito por James Marsden, de X-Men).O curioso do filme (e certamente o livro) é que a história tem uma espécie de moldura, é uma história que está sendo contada por James Garner para Gena Rowlands (por sinal, mãe do diretor) num asilo de velhos. E se é fácil adivinhar a surpresa, nem por isso ela é menos emocionante. Quando percebi estava chorando que nem bobo. E chorei muito porque o final é realmente comovente, graças principalmente à simpatia de Garner e o talento de Gena, dois grandes atores que redimem o melhor melodrama da temporada. Espero não ter revelado demais porque o filme é extremamente comovente, merece ser descoberto.

Até amanhã.

Por Rubens Ewald Filho