12
de agosto de
2004
Chega
um momento quando vão se esgotando os filmes que eu posso
assistir, sobraram uns poucos longe, fora de mão ou sem
interesse. Mas tem alguns momentos que gostaria de comentar.
Como a cena de Zaitochi, onde o filme pára
a fim de exibir uma seqüência de dança, uma
espécie
de festival de primavera que na verdade é um número
de sapateado muito parecido com o americano. Quase no final (nunca
tinha ouvido falar disso). Vi também que o filme colombiano
Maria Full of Grace, andou ganhando alguns prêmios
de interpretação,
parece que até em Berlim. Loucura de Festival, a moça é até bonitinha,
mas dai a ser premiada… Ontem, fui à Tower (cruzei
com o Manoel Carlos, o escritor, que tinha ido alugar filmes)
e trouxe dois DVDs interessantes. São dois documentários
feitos por Robert Greenwald (que é o diretor e produtor
de Xanadu e dezenas de telefilmes) que estão
fazendo um caminho curioso.
São Outfoxed
e Uncovered: the Whole Truth about
The Iraq War. Ambos saíram primeiro em DVD, foram apresentados
em festas particulares (está muito na moda aqui, as pessoas
se reúnem para ver uma fita em primeira mão ou
uma série de TV) e depois estão passando também
nos cinemas. São dois documentários (o do Iraque
não chega a uma hora, o outro tem hora e dez) totalmente
anti-Bush, composto por depoimentos e imagens da TV. O primeiro
acho o mais interessante, porque a proposta menos conhecida; é uma
denúncia do canal Fox News Channel de Rupert Murdoch,
que é acusado frontalmente de ser de direita, a serviço
do presidente Bush e sempre contra tudo que é liberal
ou democrata. Acusam e provam apresentando os comentários
e apresentadores, totalmente parciais, negando justamente tudo
aquilo que era sagrado até agora: que o jornalismo deveria
ser honesto e imparcial. Eles insinuam, meias verdades (Alguns
dizem que…), mandam os opositores calarem a boca e trabalham
com agendas e cartas marcadas. Essa pesquisa foi feita por mulheres
aposentadas, voluntárias que ficaram diante da televisão
Fox assistindo tudo e anotando. Então o resultado é muito
claro e evidente, não deixa margem a dúvidas. Acho
importante que estejam fazendo isso por algumas razões:
1) É a volta do cinema político. 2) Embora usando
medias novas, como o DVD, novamente é o cinema indo até contra
a TV, coisa raríssima hoje em dia. 3) Em ano de eleição
são usados como contra-informação e por
caminhos alternativos de distribuição, ou seja,
ainda existe gente inteligente em alguma parte. 4) Podem servir
de exemplo para os documentaristas brasileiros fazerem filmes
mais empenhados e polêmicos. O outro documentário
do Iraque é menos impactante, porque quase tudo já foi
dito e mostrado por Michael Moore. O diferente é que a
tese de Bush para invadir o Iraque é demolida por insiders,
gente da própria CIA ou a chamada comunidade de inteligência,
que desmentem, discutem e rejeitam todas as teses apontadas por
ele. Ou seja, os próprios envolvidos, embaixadores ou
agentes, negam tudo que Bush usou como justificativa para invadir
o Iraque (e um deles lembra, mentir é crime!). Enfim,
estou levando os filmes para o Felipe (meu assistente) mostrá-los
na Faculdade de Santos. É a primeira vez que estou vendo
Cinema/DVD ser usado como arma de luta política.
Intimate
Strangers (Confidences Trop Intimes)
Embora
pouco conhecido no Brasil, o diretor francês Patrice
Lecomte é super prestigiado nos EUA, onde os críticos
gostam de seu estilo discreto e sutil em fitas como Uma
Passagem para a Vida ou O Homem do Trem, A
Garota da Ponte, Ridicule.
Este é seu filme mais
recente, uma história que começa bem, com um ponto
de partida interessante: uma garota (a sempre simpática
Sandrine Bonnaire ) está procurando um terapeuta e por
engano vai parar no escritório de um contador, que ela
pensa ser psiquiatra (Fabrice Luchini). O erro é logo
corrigido, mas ela continua visitando o homem e lhe contando
sua vida, que inclui um marido ciumento que a atormenta querendo
vê-la transar com outros homens. A relação
vai crescendo, mas sempre de forma ambígua (Leconte não
chega a mostrar para o espectador o momento crucial, quando o
marido transa com a esposa num quarto diante de seu escritório
para que o contador possa ver tudo). Ou seja, foge do conflito,
do melodrama, da resolução mais contundente. É o
tipo do filme que a gente fica vendo e pensando nas inúmeras
possibilidades não aproveitadas. Mas não é mal.
A
Home at the End of the World de Michael Mayer
Não conheço ninguém que goste de Colin
Farrell, até mesmo dentre os poucos que o conhecem. No
entanto, ele continua fazendo filme após filme, demonstrando
a carência de atores e astros atualmente. Este filme pequeno
da Warner Independent é de um diretor estreante que adaptou
um livro menos conhecido de Michael Cunningham, famoso autor
de As Horas. Foi promovido porque Colin teria uma cena de nudez
frontal que ele pediu para cortar (provocando especulações).
O fato é que Colin não é bonito, não é bom
ator e de notável tem apenas uma sobrancelha (isso me
deixa assustado com que ele possa ter feito com Alexandre, de
Oliver Stone). A história é daquelas situações
humanas, mas inusitadas, sobre Bobby um menino criado nos anos
60-70, com um irmão mais velho que lhe dá LSD e
logo depois morre ao bater numa porta de vidro. Depois com o
melhor amigo de escola (são dois atores além de
Colin fazendo o papel) experimenta alguns lances homossexuais
e chega ao cúmulo de passar maconha para a mãe
do amigo (é desse tipo de filme que no fundo propaga e
divulga o uso de maconha) feita por Sissy Spacek (aliás
numa presença terna e luminosa ). Quando cresce, Bobby
vira padeiro, continua cabeludo (aliás no filme todo ele
tem aqui que americano chama de Bad Hair Day). O amigo Jonathan
(Dallas Roberts) virou gay de vez, mas Bobby parece apenas lesado,
emocionalmente lento. Só vai fazer sexo a primeira vez
com a amiga desse seu quase irmão adotivo, uma hippie
criadora de chapéus (outra grande performance de Robin
Wright Penn, que continua padecendo do problema de não
registrar na câmera, a gente a confunde com outras). Enquanto
isso, Jonathan cai na vida. Eventualmente os três irmãos
se mudam para o interior, onde abrem um pequeno restaurante e
reformam uma casa (porque a garota Clare esta grávida
de Bobby). O que nenhum anúncio diz, ou crítica
conta (talvez com medo de prejudicar a bilheteria), Jonathan
está com Aids e resta ao amigo lhe fazer companhia. Ou
seja, é uma história bonita, bem interpretada (pelas
mulheres) em que Colin se esforça para adquirir alguma
vida, dar olhares ternos e beijar rapidamente o parceiro na boca
(mas como a história toma outro rumo, fica apenas nisso).
Não é um novo As Horas.
Por
hoje é só, até a próxima.
Por Rubens Ewald Filho
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